2 de abril de 2012

Tesouro de Exemplos - Parte 49

OS DOIS SOLDADOS

Foi na guerra de 1914-18. Um soldado francês narra o seguinte fato:
"Nunca me esquecerei de um episódio, que eu mesmo presenciei. Atacamos à tarde; depois de algumas oscilações, penetramos na trincheira inimiga, onde jaziam cadáveres horrendamente massacrados pelos canhões 75.
No momento do novo ataque, uma metralhadora inimiga camuflada abateu alguns dos nossos; eu fui um dêles. Passados os primeiros instantesde terrível impressão pelo ferimento recebido, olhei ao redor. Dois soldados jaziam por terra agonizantes: um alemão, bávaro, louro e muito môço, com o ventre dilacerado, e ao lado dêle um francês, igualmente jovem. Ambos manifestavam já a palidez da morte; a minha maior dor era de não poder mover-me para socorrer ou ao menos suavizar a morte do meu camarada.
Foi quando o francês, com supremo esfôrço, procurou com a mão alguma coisa que estava sôbre o peito, debaixo do capote. E tirou um pequeno crucifixo que levou aos lábios; depois, com voz fraca, mas ainda clara, rezou: Ave, Maria...
Vi então outra coisa. O alemão, que até aquêle momento não dera sinal de vida, abriu os olhos azuis e meio apagados, virou a cabeça para o francês e respondeu: Santa Maria Mãe de Deus...
O francês, um tanto, surpreendido, olhou para o seu vizinho; seus olhares encontraram-se; o francês apresentou o crucifixo ao bávaro, que o beijou; apertaram-se as mãos num frêmito de amor a Deus e à pátria; seus olhos fecharam-se, e o espírito desprendeu-se do corpo, enquanto o sol os iluminava através de púreas nuvens... "Amém, disse, e fiz o sinal da cruz".

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