19 de abril de 2021

Histórias das Cruzadas - Livro Primeiro - Origem e Progresso do Espírito das Cruzadas 30

O concílio de Clermont renovou a trégua de Deus. Desde o domingo no começo do jejum, até a segunda-feira ao despontar do sol, depois da oitava de Pentecostes, desde a quarta-feira que precede o Advento do Senhor, ao por do sol até a oitava da Epifania, era proibido a todos os homens provocar um outro, matá-lo, feri-lo, ou arrebatar-lhe bens ou gado. A mesma proibição era feita para todas as semanas do ano, desde a quarta-feira ao por do sol, até a segunda-feira ao nascer do sol, e para todas as festas do ano, as festas de Nossa Senhora e dos Apóstolos, com suas vigílias. O concílio decidiu, além disso, que todas as igrejas e seus átrios, as cruzes das estradas, os monges e os clérigos, as freiras e as mulheres, os peregrinos, os negociantes com seus familiares, os bois, os cavalos de tração, os homens, trabalhadores da charrua, os pastores e seus rebanhos, gozariam de uma paz perpétua e ficariam sempre ao abrigo da violência e do banditismo.
Todo o cristão, desde a idade de doze anos, devia jurar submeter-se à trégua de Deus e armar-se contra os que se recusassem ao juramento e sua submissão a essa lei. Todos os que não jurassem obedecer à trégua de Deus, seriam feridos com o anátema.
Assim proclamava-se ao mesmo tempo a trégua de Deus e a guerra de Deus. O concílio fez muitas regras para a disciplina eclesiástica e a reforma da Igreja, mas todos esses decretos, mesmo a excomunhão lançada contra o Rei da França Felipe I, não puderam afastar a atenção geral de um assunto, que se considerava como muito mais importante: o cativeiro e as desgraças de Jerusalém.
O entusiasmo, o fanatismo, que sempre crescem nas reuniões numerosas, tinham sido levados ao auge. Urbano satisfez por fim à impaciência dos fiéis. O concílio teve sua décima reunião na grande praça de Clermont que logo se encheu de uma multidão enorme. Seguido por seus cardeais, o Papa subiu a uma espécie de trono, que haviam erguido para ele; ao seu lado estava Pedro, o Eremita, com o bordão de peregrino e a capa de lã, que por toda a parte lhe havia atraído a atenção e o respeito da multidão. O apóstolo da guerra santa falou primeiro dos ultrajes feitos à fé de Cristo: recordou as profanações e os sacrilégios de que fora testemunha, os tormentos e as perseguições que um povo sem Deus fazia sofrerem àqueles que iam visitar os santos lugares. Ele tinha visto cristãos carregados de grilhões, levados à escravidão, atrelados ao jugo, como animais de carga; ele tinha visto os opressores de Jerusalém vender aos filhos de Cristo a licença de saudar o túmulo de seu Deus, arrancar-lhes até o mesmo pão da miséria e atormentar a mesma pobreza, para conseguir tributos; ele tinha visto os ministros do Todo-Poderoso tirados do Santuário, vergastados, e condenados a uma morte ignominiosa. Narrando as desgraças e a vergonha dos cristãos, Pedro tinha o rosto abatido e consternado; sua voz era
entrecortada de soluços, sua viva emoção penetrava todos os corações.

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