3 de maio de 2018

Retratos de Nossa Senhora, Juan Rey, S. J.,

RETRATOS DE NOSSA SENHORA

A Imaculada Conceição


Parte 4/6

Ponde a mão sobre o coração e dizei-me o que teríeis feito com a vossa Mãe neste caso. 
O Filho de Deus tinha de habitar nove meses naquele tabernáculo santo, e consentiria que aquele palácio seu tivesse servido antes de morada do demônio, o seu maior inimigo?
Vivia em Toledo um fidalgo castelhano. O seu pundonor podia servir de espelho aos cavalheiros do século XVI, século em que o pundonor abundava mais do que nos nossos tempos. O seu nome ficou imortalizado pelo feito que os poetas celebraram. O conde de Benavente. No régio Alcácer de Toledo, nesse Alcácer cujo nome ressoou ultimamente em todo o mundo pelo heroísmo dos seus defensores, nesse Alcácer toledano vivia o Imperador Carlos V. E veio visitar o Imperador o duque de Bourbon, súbdito do rei de França, mas que se tinha passado para as fileiras de Carlos V, e na batalha de Pavia tinha lutado contra o seu próprio rei.
O duque vinha a Toledo para receber do Imperador a recompensa da sua traição e o Imperador suplicou ao conde de Benavente que hospedasse o francês no seu palácio. O castelhano negou-se a recebê-lo. O Imperador obrigou-o a que o hospedasse. O vassalo obedeceu ao seu rei; porém ele com a sua família retirou-se para a casa de um parente seu. Depois de uma demora de uns dias o duque de Bourbon saía da cidade. Na noite seguinte as chamas de um incêndio gigantesco rompiam na escuridão de Toledo. O palácio de Benavente com todas as suas riquezas ficava reduzido a cinzas. O próprio conde tinha-lhe posto fogo porque tinha vivido nele um traidor, e o nobre castelhano já não podia viver ali, o palácio tinha ficado manchado. A tanto chega o pundonor de um homem.
E o Filho de Deus havia de tolerar que o palácio destinado para ele viver, fosse primeiro profanado com a presença do seu inimigo, o demônio?
"Descuit", convinha.
Havia razão para Deus fazer uma exceção à lei, e fê-la.
Maria estava destinada a ser Corredentora do mundo juntamente com Jesus Cristo. Tinha que destruir o império do pecado em união com o Redentor, como Eva em companhia de Adão o tinha introduzido no mundo, e não era conveniente que a destruidora do pecado começasse a vida sendo vítima dele.
Um dia o Filho de Deus, do seu trono de glória a direita do Pai inclinar-se-ia para a terra, onde sua Mãe vivia desterrada e lhe diria : "O inverno da dor passou, a chuva das tribulações cessou, as nuvens da prova dissiparam-se; já chegou a primavera eterna; minha Mãe, vem receber a coroa que te pertence". E Maria, sem sofrer a corrupção do sepulcro, elevar-se-ia ao céu.
Diante dela iria Jesus Cristo conduzindo-a até o trono da divindade e logo a coroaria como rainha dos céus e mandaria a todos os espíritos celestiais que lhe rendessem vassalagem.
Ah! se Maria não tivesse sido imaculada na sua conceição, se por algum tempo tivesse estado manchada com a culpa, se por um instante sequer tivesse sido escrava de Satanás, os anjos teriam podido dizer a Jesus Cristo: "Senhor, vós escolhestes para remir o mundo uma natureza inferior à nossa; e ainda que víssemos essa natureza ensanguentada e coberta de opróbrios, nós a adoraríamos, porque esteve sempre limpa de pecado e porque a divindade se tinha unido a ela. Porém, como quereis que veneremos essa mulher que nos apresentas como rainha, como queres que a reconheçamos superior a nós, se tendo uma natureza inferior à nossa a teve manchada com o pecado e nós nunca nos contaminamos com ele? Que reine sobre os homens, pecadores como ela; porém, que títulos pode apresentar para reinar sobre nós? "
Convinha.
Sim, convinha à dignidade de Mãe de Deus, convinha ao ofício de corredentora, convinha à dignidade de rainha dos céus que nunca estivesse manchada com o pecado; e como convinha, e Deus podia fazê-lo, fê-lo.

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