[Sermão] É preciso rezar, e rezar bem.
Sermão para o Quinto Domingo depois da Páscoa
5 de maio de 2013 - Padre Daniel Pinheiro
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave-Maria…
***
É o terceiro domingo seguido, caros
católicos, em que Nosso Senhor Jesus Cristo nos fala de sua subida aos
céus, de sua Ascensão, que será comemorada na próxima quinta-feira,
quarenta dias depois de sua Ressurreição. A Ascensão de Nosso Senhor é, à
primeira vista, um motivo de tristeza para os Apóstolos e para os
discípulos do Mestre, ainda muito voltados para as coisas terrenas. Da
mesma forma, poderíamos pensar que, para nós, nossa alegria seria muito
maior com a presença de Nosso Senhor na Terra. Todavia, era preciso que
Cristo subisse ao Pai, para sentar-se à direita dEle – nem acima, nem
abaixo, mas à direita – para manifestar a igualdade de natureza com o
Pai. Era preciso que Cristo subisse aos céus também para manifestar,
definitivamente, que seu sacrifício sobre a cruz foi perfeitamente
aceito por Deus. Além disso – manifestar a divindade de Cristo e a
aceitação de seu sacrifício – a Ascensão tem também consequências
excelentes para nós. Nosso Senhor afirma que é bom para nós que ele suba
ao Pai, a fim de poder enviar o Paráclito, que ensinará toda a verdade
aos apóstolos, mas também porque no céu Ele intercederá por nós diante
do Pai. Assim como o sumo sacerdote do Antigo Testamento entrava no
Santo dos Santos para interceder pelo povo, Cristo entra na glória
celestial para interceder por nós, como nos diz São Paulo (Hebreus VII,
25), pois sua simples presença, com sua natureza humana e as chagas
gloriosas de seu sacrifício, é já uma intercessão por nós. Deus, vendo a
natureza humana de Cristo, terá misericórdia daqueles que Cristo veio
salvar, terá misericórdia de nós.
Tendo sido fortalecido na fé quanto à
divindade de Cristo e de sua intercessão por nós no céu, podemos
dirigir, com toda confiança, nossas orações a Deus. E tudo o que
pedirmos em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo, explicitamente ou
implicitamente, obteremos, nos diz Ele no Evangelho de hoje. Todavia,
nosso Salvador diz em outra ocasião que no dia do juízo haverá muitos
que invocaram seu nome, mas que não se salvaram. E quantas vezes, de
fato, nossas orações não são atendidas, apesar de invocarmos a mediação
de Cristo. Isso se explica facilmente, caros católicos. Não basta rezar,
invocando o nome de Nosso Senhor. É preciso rezar bem. O apóstolo São
Thiago nos diz claramente: “Vós pedis e não recebeis porque pedis mal” (Thiago IV, 3).
***
Para rezar bem, é preciso primeiramente, que nossa alma esteja em boas disposições. Em seguida, é preciso pedir coisas boas, quer dizer, coisas que nos dirigem para Deus. Finalmente, é preciso pedir de um modo digno da majestade divina à qual nos dirigimos. Se seguimos esses três pontos, nossa oração será atendida.
É preciso, então, que estejamos bem dispostos.
Isso significa que, quando rezamos, devemos estar em estado de graça,
em amizade com Deus ou pelo menos não devemos estar endurecidos no mal,
se por infelicidade nos afastamos de Deus pelo pecado. Deus não costuma
ouvir o homem que, endurecido no mal e sem se preocupar com o estado de
sua alma, recorre a Ele somente para pedir coisas temporais. E se às
vezes Deus o ouve, pode se tratar mais de uma punição do que de um favor
propriamente dito. Evidentemente, se o pecador começa a querer detestar
seu pecado e começa a voltar-se para Deus, Ele, infinitamente bom e
misericordioso, olhará com compaixão e amor para o pecador e lhe dará
graças de conversão, penitência e perdão. Para rezar bem devemos estar
bem dispostos.
Em seguida, devemos pedir algo que é bom.
Acabamos de ouvir Nosso Senhor dizer no Evangelho: tudo o que pedirdes a
meu Pai em meu nome, Ele vos dará. Ora, Deus, sendo a bondade perfeita,
nos dá tudo aquilo que pedimos, desde que isso seja uma coisa boa. Se
Ele nos desse algo ruim, Ele estaria em contradição com sua bondade
infinita. E uma coisa é boa nessa terra se ela nos ajuda, de um modo ou
de outro, a ganhar o céu. Assim, quando pedimos a nossa salvação ou
coisas necessárias para a nossa salvação – como as virtudes, por
exemplo, ou quando pedimos para vencer um vício – nós podemos estar
seguros de que seremos atendidos, se estamos bem dispostos e se
observamos as outras condições das quais falaremos em breve. Podemos
também e devemos pedir coisas temporais (como a saúde, por exemplo, e
bens materiais). Mas como essas coisas podem tanto nos aproximar quanto
nos afastar de Deus, com muita frequência Ele não nos concede esses bens
temporais, pois eles nos afastariam de sua divina majestade. Vale muito
mais ser doente e suportar em união com Deus e com paciência uma doença
do que estar com saúde, mas utilizar essa saúde para fazer o mal.
Assim, quando pedimos coisas temporais a Deus, devemos nos submeter
inteiramente à sua divina sabedoria, que poderá nos conceder ou negar
tais bens em virtude da utilidade ou não deles para a nossa salvação. E
Ele sabe muito melhor do que nós o que é útil para nossa salvação. Dessa
forma, nossa oração deve ter por objeto todo bem espiritual que nos
dirige para a nossa salvação. Nossa oração pode ter por objeto também as
coisas temporais, sabendo que Deus pode atender a essa oração ou não,
na medida em que esses bens temporais são bons ou não para a nossa alma.
Para rezar bem, é preciso, então, uma boa disposição e é preciso pedir
coisas boas. Santo Agostinho diz que aquele que pede coisas contrárias à
salvação, não as pede em nome de Cristo, por mais que o nome de Nosso
Senhor seja invocado.
Além de ter uma boa disposição e
de pedir o que é bom, devemos pedir de uma maneira que seja digna da
majestade divina à qual nos dirigimos. Isso quer dizer que
devemos rezar com uma verdadeira piedade. Essa piedade não se confunde
com um ardor mais ou menos sentimental. Ao contrário, essa piedade se
realiza com a atenção, com a humildade, com a confiança e com a
perseverança.
Devemos, então, rezar com atenção:
a distração voluntária – enfatizo bem: voluntária – acompanha muito mal
o pedido de algo que não nos é devido. Como desejar que Deus ouça os
nossos pedidos, se nós mesmos não escutamos aquilo que estamos dizendo?
Se rezamos sem atenção, com sonolência, pensando em mil coisas alheias à
oração, já não se trata de oração, pois nossa inteligência e vontade se
aplicam a outra coisa. Honramos Deus com os lábios, mas não com o nosso
coração, com nosso espírito. Assim, devemos evitar as distrações
voluntárias e combater as distrações involuntárias. E, se por fraqueza,
não conseguirmos vencer as distrações involuntárias, nossa oração será,
mesmo assim, plenamente agradável a Deus, pois fizemos o possível, com
generosidade, para afastá-las, combatendo-as. Para evitar as distrações,
é preciso escolher, na medida do possível, as circunstâncias que
favoreçam a oração. Circunstâncias de lugar, horário… Ao rezarmos,
devemos evitar também toda precipitação, rezar muito rápido, comendo as
palavras… Uma Ave-Maria bem dita honra mais a Nossa Senhora e dá mais
frutos do que 100 rezadas de qualquer jeito. Rezar com atenção demanda
esforço e paciência. Não devemos desistir sob pretexto de que não
conseguimos; devemos progredir, ainda que lentamente.
Não basta rezar com atenção, devemos rezar com humildade.
A Sagrada Escritura nos ensina que Deus resiste aos soberbos, mas que
Ele dá a sua graça aos humildes. Devemos, então, quando rezamos, nos
apresentar diante de Deus como o publicano, reconhecendo nossa
incapacidade, nossas misérias, nossas fraquezas, nossa indignidade. Essa
humildade é, antes de tudo, interior e ela faz que nos apoiemos
unicamente na misericórdia infinita de Deus e nos méritos infinitos de
Cristo. Essa humildade interior termina por se manifestar também
exteriormente: o publicano não ousava nem levantar seus olhos. Se nos
apresentamos diante de Deus com presunção e arrogância, com grande
estima de nós mesmos e para mostrar nossas virtudes, nossas orações
serão infalivelmente estéreis. Elas serão também estéreis se, mais do
que orações, elas são exigências, como se Deus fosse obrigado a nos dar
aquilo que pedimos. Deus resiste aos soberbos. Mas a oração daquele que
se humilha penetra nos céus.
A piedade na oração implica também uma grande confiança.
Nossa oração deve ser confiante porque ela se dirige a Deus, que é
todo-poderoso e que quer o melhor para nós. Nossa oração se dirige à
infinita bondade de Deus, que nos governa, que cuida de nós e que quer o
melhor para nós. Se Deus nos ajuda – e felizmente – mesmo quando não
pedimos, como foi o caso nas Bodas de Caná, podemos ter certeza que Ele
nos ouvirá se rezamos bem. Essa confiança na oração é um preceito dado
por São Thiago : “se alguém quer pedir algo a Deus, peça com confiança.”
Não deixemos de ter essa confiança, caros católicos, em nossas orações.
A última qualidade da oração piedosa é a perseverança.
Não basta pedir um instante, uma vez ou algumas vezes para sermos
ouvidos, como se pudéssemos determinar o momento em que Deus deve nos
conceder seus favores. Deus nos pede a perseverança na oração porque com
muita frequência Ele não nos atende imediatamente, a fim de provar e
purificar a nossa fé e confiança, a fim de nos fazer rezar mais, a fim
de nos fazer apreciar melhor suas graças ou por outra razão digna de sua
sabedoria. Vejamos, por exemplo, a perseverança do paralítico na
piscina probática: ele esperou 38 anos, ele perseverou durante 38 anos. E
por que Deus fez esse paralítico esperar 38 anos ? Para que ele fosse
curado pelo Messias e para que, por meio dessa cura, os outros pudessem
reconhecer o Verbo de Deus encarnado. Após 38 anos de espera, a cura foi
muito mais perfeita não somente para o paralítico mas também para os
outros. A espera de 38 anos foi recompensada pela cura da alma dos que
presenciaram a cena. E quantos exemplos de perseverança no Evangelho: a
cananéia, que insiste para que Nosso Senhor dê as migalhas destinadas
aos cachorros, o amigo importuno que pede o pão e tantos outros.
Devemos, ainda, acrescentar um desejo ardente de sermos atendidos, pois é a nossa salvação que está em jogo.
Devemos rezar com diligência e querendo ser atendidos e não com
indiferença ou tibieza. O Anjo disse ao Profeta Daniel: você foi
atendido porque você é um homem de desejos
Eis, então, caros católicos, como devemos rezar. Mas
falta algo que aumenta muito a eficácia de nossas orações: confiá-la
nas mãos de Maria Santíssima para que ela apresente nossas súplicas ao
seu Filho.
Assim, se não estamos endurecidos no
pecado, se pedimos coisas úteis para nossa salvação, e as pedimos com
atenção, humildade, confiança, perseverança e fervor, seremos sempre e
infalivelmente atendidos por Deus, se pedimos algo para nós mesmos.
Rezemos, então, e rezemos muito e rezemos bem porque a oração bem feita é
o alimento da nossa alma. Ela é a arma de defesa e de ataque contra o
demônio, as tentações, o pecado. A oração bem feita é a chave dos
tesouros celestes. Ela é o grande meio para nossa santificação e
salvação. E se temos dificuldades para fazer uma boa oração, e
certamente o temos, façamos como os Apóstolos e peçamos a Nosso Senhor
que nos ensine a rezar, porque aquele que reza bem se salva, enquanto
aquele que não reza se condena.
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.
Nenhum comentário:
Postar um comentário