Sermão para a Festa da Santíssima Trindade
(Primeiro Domingo depois de Pentecostes)
26 de maio de 2013 - Padre Daniel Pinheiro
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave-Maria…
“Ide, pois, e ensinai todas as gentes, batizando-as em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo.”
Caros católicos, a Igreja nos fez
reviver, desde o Tempo do Advento até Pentecostes, a vida de Nosso
Senhor Jesus Cristo. Preparamo-nos para o seu nascimento, comemoramos o
seu nascimento, festejamos a sua circuncisão na oitava do Natal,
comemoramos a visita dos reis magos na Epifania, festejamos a
Purificação de Nossa Senhora e a Apresentação do Menino Jesus no Templo.
Entramos na Quaresma, com a tentação de Nosso Senhor no deserto, com
sua pregação e a oposição mortal dos fariseus. Lembramos sua entrada
triunfante em Jerusalém no Domingo de Ramos, a Instituição da
Eucaristia, da Missa, do Sacerdócio na Quinta-Feira Santa. Sua Paixão e
Morte na Cruz na Sexta-Feira Santa. Sua Ressureição gloriosa, sua
Ascensão, o envio do Espírito Santo sobre Nossa Senhora e os Apóstolos,
encerrando o Tempo Pascal. Nós começamos agora o Tempo que, na liturgia
tradicional, se chama Tempo depois de Pentecostes e que
significa liturgicamente a aplicação dos méritos infinitos obtidos por
Cristo durante toda a sua vida na terra. Essa aplicação se faz por obra
do Espírito Santo, a quem se atribuem as obras de santificação. Esse
Tempo depois de Pentecostes é justamente um prolongamento de
Pentecostes, com o Espírito Santo que atua na Igreja e nas almas, para
nos conduzir ao céu.
Nesse primeiro domingo depois de Pentecostes, festejamos a Santíssima Trindade.
São dois os principais mistérios da religião revelada por Deus aos
homens. O mistério da Encarnação do Verbo e o mistério da Santíssima
Trindade. Se queremos ser agradáveis a Deus, devemos ter a fé, quer
dizer, devemos acreditar – com nossa inteligência – firmemente e com
toda certeza aquilo que Deus nos revelou. São Paulo diz que sem a fé não
podemos agradar a Deus e, com o mesmo sentido, Santo Atanásio diz que
se queremos nos salvar, devemos, antes de tudo, ter a fé e conservá-la
íntegra e sem mancha. Assim, se queremos agradar a Deus, devemos crer e
confessar que Deus é Uno e Trino. Se queremos nos salvar, devemos crer e
confessar que existe um só Deus em três Pessoas, pois Deus, que não
pode se enganar nem nos enganar, nos disse que Ele é um só Deus em três
Pessoas. Portanto, caros católicos, quando cultuamos Deus, quando
adoramos Deus e o servimos, não estamos cultuando uma entidade mais ou
menos vaga, não estamos cultuando o supremo arquiteto do universo da
maçonaria, não estamos cultuando a mãe natureza ou uma força, uma
energia positiva. Não estamos cultuando um Deus que se confunde com o
mundo. Cultuamos, isso sim, um Deus que é puro espírito, infinitamente
bom e amável, onisciente, onipotente, eterno… Cultuamos um Deus que é
distinto das criaturas e que mantém na existência tudo o que criou e que
governa tudo com suprema bondade e misericórdia. Nós cultuamos um só
Deus em três Pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo. Essas três Pessoas
são um só Deus e não três deuses porque as três têm uma só substância,
uma só natureza, uma só essência, uma só divindade; as três são
igualmente eternas, igualmente poderosas, nenhuma das três é uma
criatura. Um só Deus, um só Senhor em três Pessoas realmente distintas. A
única diferença que existe entre as três Pessoas da Santíssima Trindade
é o fato de uma proceder da outra. O filho procede do Pai desde toda a
eternidade. O Espírito Santo procede do Pai e do Filho desde toda a
eternidade. O Pai não procede de ninguém.
A Santíssima Trindade, como falamos, é um
mistério. É um mistério pois nossa razão não pode sozinha chegar à
conclusão de que Deus é um em três Pessoas. Precisamos da Revelação para
conhecer isso. É famosa a história de Santo Agostinho, que buscava
compreender a Santíssima Trindade quando escrevia seu livro sobre o
assunto. Deus lhe mostrou como esse mistério é inacessível à pura razão
comparando o seu desejo ao desejo de um menino que queria colocar toda a
água do mar em um buraco cavado na areia da praia. Diante do mistério
da Santíssima Trindade, muitos inimigos da religião pretendem combatê-la
dizendo que a fé é irracional, pois não podemos compreender aquilo em
que acreditamos. Caros católicos, a fé não é irracional. Ao contrário,
ousaria dizer que não existe nada de mais conforme à razão do que a fé.
A fé supera a razão, mas a fé não contradiz a razão. Poderíamos
comparar as verdades da fé com relação à nossa inteligência com uma
equação do segundo grau para uma criança de cinco anos. A equação supera
a inteligência da criança, mas nem por isso a equação contradiz a
inteligência daquela criança ou se torna irracional. Da mesma forma, as
verdades sobrenaturais não se tornam irracionais pelo fato de superarem
nossa razão. Nossa inteligência não consegue compreender o mistério da
Santíssima Trindade, mas ela consegue mostrar que não se trata de um
absurdo, ela consegue responder às objeções contrárias à Santíssima
Trindade, ela consegue mostrar que é possível a existência de um só Deus
em três Pessoas. Ela consegue, por meio de analogias e comparações,
entender melhor o mistério, embora não consiga demonstrá-lo ou
explicá-lo completamente. Podemos compreender um pouco o mistério da
Santíssima Trindade fazendo, por exemplo, uma analogia com a nossa
inteligência e com a nossa vontade. O Verbo é gerado porque Deus conhece
a si mesmo perfeitamente desde toda a eternidade. Esse conhecimento que
Ele tem de si gera o Filho ou Verbo, a Segunda Pessoa da Santíssima
Trindade. Esse Filho gerado é em tudo igual ao Pai, salvo justamente o
fato de proceder do Pai. Do amor que existe entre o Pai e o Verbo – amor
que existe desde toda a eternidade – procede o Espírito Santo. O
Espírito Santo é em tudo igual ao Pai e ao Filho, salvo o fato de
proceder de ambos. Essa geração do Filho e o proceder do Espírito Santo
não diminuem em nada o Filho e o Espírito Santo com relação ao Pai. Os
três são igualmente eternos, igualmente perfeitos. Os três são um só
Deus. O mistério da Santíssima Trindade supera a nossa razão, mas não a
contradiz.
Além disso, caros católicos, nossa razão é
capaz de reconhecer a existência de Deus e ela reconhece que Deus é
infinitamente perfeito. Diante disso, a nossa razão reconhece que se
Deus nos falar, somos obrigados a aceitar porque Deus, infinitamente
perfeito, não pode se enganar nem nos enganar. E aceitar aquilo que Deus
nos falou não é humilhar a nossa inteligência, mas ao contrário,
aceitar as verdades de fé é a maior exaltação a que pode chegar nesse
mundo a nossa inteligência, pois a fé aumenta a capacidade de
conhecimento da nossa razão e faz que nossa razão penetre na ordem
sobrenatural. A fé não é contrária à razão. Deus é o autor da fé e da
razão. Ele não pode se contradizer colocando as duas em oposição. A fé
não diminui a razão. A fé aperfeiçoa e eleva a nossa razão, a nossa
inteligência humana. É melhor ser mais perfeito com a ajuda de outro –
no caso, Deus – do que permanecer sozinho na imperfeição ou na
mediocridade.
Se Deus falou, devemos, então, acreditar.
Lendo a Sagrada Escritura, aparece claramente que Deus revelou ser Uno e
Trino. Ele revelou isso abertamente no Novo Testamento e deu indícios
fortíssimos no Antigo Testamento.
Não convinha que a Santíssima Trindade
fosse revelada plenamente aos judeus pelo risco que havia de eles caírem
no politeísmo, sem compreender bem a Trindade das pessoas e pelo fato
de estarem cercados de pagãos politeístas. Mas já a primeira frase da
Sagrada Escritura indica a Santíssima Trindade: “No Princípio criou Deus o céu e a terra e o Espírito de Deus movia-se sobre a água”. Ora, “no Princípio” era o Verbo, diz São João. “Deus” é Deus Pai. O “Espírito de Deus que se move sobre a água” é o Espírito Santo. Além disso, nessa mesma frase em hebreu, a palavra “Deus” é Elohim, que é uma forma plural, mas o verbo – “criou” – se encontra no singular. No plural da palavra Elohim, temos a pluralidade de pessoas. No singular do verbo “criou” temos a unidade da essência. Ainda no primeiro capítulo do Gênesis Deus disse: “façamos o homem à nossa imagem e semelhança”.
O verbo “façamos” no plural indica a pluralidade de pessoas. “À nossa
imagem e semelhança” no singular indica a unidade da essência. Davi diz
no Salmo (LVI): “Abençoe-nos Deus, o nosso Deus, abençoe-nos Deus.”
Invoca três vezes Deus: Deus Pai, Deus Filho, Deus Esp. Santo. E o que
está no meio é chamado de maneira sublime nosso Deus, pois faz
referência ao Filho, que assumiu nossa carne, veio ao mundo para nos
salvar. O Profeta Isaías diz: “Sanctus, Sanctus, Sanctus”, referência ao
Pai, ao Filho, ao Espírito Santo. E poderíamos ainda citar outras
passagens do Antigo Testamento que fazem referência à Sant. Trindade.
No Novo Testamento, Nosso Senhor ensina
abertamente a Trindade das Pessoas em Deus. Temos o Evangelho de hoje:
“Ide, pois, e ensinai todas as gentes, batizando-as em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo.” “Nome”
está no singular, para significar a unidade de essência em Deus. Também
quando Nosso Senhor diz: “Quando vier o Paráclito, que vos enviarei da
parte do Pai, o Espírito da Verdade, que procede do Pai, ele dará
testemunho de mim.” Há o Pai, o Filho e o Paráclito, que procede dos
dois, que é enviado pelo Pai e pelo Filho. Podemos citar também o
Batismo de Nosso Senhor e sua Transfiguração, em que tanto o Pai como o
Espírito Santo se manifestam para glorificar o Filho. Também os
Apóstolos ensinam a Santíssima Trindade. São João diz: “três são os que
dão testemunha no céu: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. E esses três
são um.” São Paulo na Epístola de hoje diz “dEle, por Ele e para Ele”,
com referência à Santíssima Trindade. E, claro, poderíamos multiplicar
os exemplos.
Também a Tradição exprime claramente a fé na Santíssima Trindade. Podemos mencionar o Credo de Santo Atanásio
– que recomendo a todos que leiam – e poderíamos citar os outros Padres
da Igreja. Basta, porém, considerarmos esse monumento da Tradição e da
fé que é o Rito Tradicional da Missa, e que é, em particular, uma
confissão clara da fé na Santíssima Trindade. No ofertório, pedimos à
Santíssima Trindade que receba a oblação que oferecemos na Missa: Suscipe Sancta Trinitas hanc oblationem.
Logo antes da Bênção final, exprimimos o nosso desejo de que o
sacrifício que acabou de ser oferecido aplaque a Santíssima Trindade e
lhe seja agradável. Recitamos em todos os Domingos depois de Pentecostes
o Prefácio da Santíssima Trindade. Peço que considerem atentamente as
palavras desse Prefácio que será cantado logo mais e vejam que sublime
síntese do Mistério da Santíssima Trindade está contida nessa bela
oração.
Todas as nossas ações devem ser feitas em
nome da Santíssima Trindade. Na Santa Missa, o primeiro rito é o sinal
da Cruz, para indicar que o sacrifício da Cruz vai ser renovado e
oferecido em honra da Santíssima Trindade. Permaneçamos firmes e
inabaláveis na fé na Santíssima Trindade, caros católicos, sem a qual
não podemos agradar a Deus, sem a qual não podemos nos salvar. E que,
pela firmeza dessa fé, sejamos protegidos de toda a adversidade
(Coleta). Peçamos à Santíssima Trindade que habite em nossas almas pela
graça. Bendita seja a Santíssima Trindade e a Unidade Indivisa, como nos
diz o Intróito da Missa de hoje.
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.
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