I. EUCARISTIA COMO SACRAMENTO
Catecismo Romano
Os pastores devem, antes de tudo, conhecer a matéria deste Sacramento, já para que eles mesmos o possam consumar validamente, já para que os fiéis tenham uma noção de seu valor simbólico, e nutram em si o amoroso e intenso desejo de possuir aquilo que a matéria significa.
V.1.Pão de trigo
Dupla é a matéria deste Sacramento. Uma é o pão feito de trigo. Falaremos desta em primeiro lugar, e da outra nos ocuparemos mais adiante.
Dizem, pois, os Evangelistas Mateus, Marcos e Lucas, que Cristo Nosso Senhor tomou pão em Suas mãos, benzeu-o e partiu-o, pronunciando as palavras: "Isto é o meu Corpo" (Mt XXVI, 26; Mc XIV, 22; Lc XXII, 19). No Evangelho de São João, Nosso Senhor também disse de Si mesmo que era pão, quando declarava: "Eu sou o pão vivo, que desci do Céu" (Jo VI, 41).
Ora, o pão pode ser de várias espécies, ou porque difere na matéria de que é feito, havendo pão de trigo, de cevada, de legumes, e de outros produtos da terra; ou porque difere nas várias maneiras de se preparar, havendo pão levedado e pão sem fermento de espécie alguma.
Quanto à primeira espécie, as palavras do Salvador mostram que o pão deve ser feito de trigo. Pois, na linguagem comum, não há dúvida que se pensa em pão de trigo, quando nos referimos ao pão sem mais explicações.
Esta interpretação é também confirmada por uma figura da Antiga Aliança; pois o Senhor havia prescrito que os pães de proposição, símbolo deste Sacramento, fossem feitos da mais pura farinha de trigo.
Assim como só ao pão de trigo podemos considerar matéria apta para se fazer o Sacramento: assim também nos será fácil concluir que o pão deve ser ázimo, se nos cingirmos ao exemplo que deu Cristo Nosso Senhor. Com efeito, Ele fez e instituiu este Sacramento no primeiro dia dos ázimos, no qual não era permitido aos Judeus terem em casa coisa alguma que fosse fermentada.
Querendo alguém alegar a autoridade de São João Evangelista, segundo o qual tudo se realizara "na véspera da Páscoa" (Jo XIII, 1), a objeção pode ser facilmente rebatida. Diziam os outros Evangelistas que era no "primeiro dia dos ázimos", quando Nosso Salvador celebrou a Páscoa, porque os dias santos dos ázimos já começavam quinta-feira de tarde; mas era o mesmo dia que São João designava como vigília da Páscoa, pois ele queria antes de tudo indicar o espaço de um dia natural, que começa com o nascer do sol. Por isso é que também São João Crisóstomo considerava como primeiro dos ázimos o dia, em que pela tarde se deviam comer os pães ázimos.
E o Apóstolo mostra-nos quanto a consagração de pão ázimo condiz com a pureza e integridade interior que os fiéis devem apresentar, desde que se aproximam para receber este Sacramento. Motivo por que nos exorta: "Deitai fora o velho fermento, para que sejais uma massa nova, porquanto sois ázimos; pois Cristo foi imolado, para ser a nossa Páscoa. Portanto, celebremos o nosso banquete, não com o velho fermento, nem com o fermento da malícia e perversidade, mas com os ázimos da sinceridade e da verdade" (I Cor V, 7ss).
Este requisito, porém, não é tão essencial, que sem pão ázimo não se possa consumar o Sacramento. Ambas as espécie de pão, quer ázimo, quer fermentado, conservam o nome e as qualidade de verdadeiro pão.
No entanto, a ninguém é lícito modificar, por alvitre, ou antes, por capricho próprio, este louvável costume de sua Igreja. Muito menos o poderiam fazer os sacerdotes do rito latino, aos quais os Soberanos Pontífices ainda por cima ordenaram celebrassem os Sagrados Mistérios só com pão ázimo.
A respeito da primeira matéria deste Sacramento, bastam as noções que acabamos de expender. Convém apenas advertir que a Igreja nunca determinou quanta matéria se deve empregar para a consagração do Sacramento, por não ser possível determinar também o número das pessoas, que possam ou devam receber os Sagrados Mistérios.
V.2. Vinho de uva
Resta-nos, agora, falar da segunda matéria deste Sacramento. É o vinho pisado do fruto da vide, ao qual se mistura um pouco de água.
A Igreja Católica sempre ensinou que Nosso Senhor e Salvador empregava vinho na instituição deste Sacramento, pois Ele mesmo havia dito: "Doravante, não tornarei a beber deste fruto da vide, até chegar aquele dia" (Mt XXVI, 29; Mc XIV, 15). Ao que comentava São João Crisóstomo: "Do fruto da vide, que certamente produzia vinho, e não água". Era como se Ele quisesse, com tanta antecedência, esmagar a heresia daqueles que julgavam que nestes Mistérios se devia usar água exclusivamente.
A Igreja, porém, sempre misturou água com o vinho. Em primeiro lugar, porque assim o fizera Cristo Nosso Senhor, conforme nos provam a autoridade dos Concílios e o testemunho de São Cipriano. Depois, porque essa mistura faz lembrar que do lado de Cristo manou sangue e água. Ademais, as "águas" significam o povo, como lemos no Apocalipse (Ap XVII, 15); assim também, misturada ao vinho, a água simboliza a união do povo fiel com Cristo, que é a sua Cabeça.
E a Santa Igreja sempre manteve este costume, por ser de tradição apostólica.
São tão fortes as razões para se misturar água ao vinho, que seria grave culpa deixar de fazê-lo. Sem embargo, a omissão não impediria que se consumasse o Sacramento.
Mas, assim como é de preceito misturar água ao vinho, nos Sagrados Mistérios, os sacerdotes devem também cuidar de não o fazer senão em pequena quantidade; pois os santos autores julgam e ensinam que essa [pouca] água se converte em vinho.
Neste sentido escreveu o Papa Honório: "No teu território, arraigou-se um abuso pernicioso, como seja o de empregar, no sacrifício, maior quantidade de água que de vinho; porquanto a razoável praxe da Igreja Universal prescreve que se tome muito mais vinho do que água".
Como estes dois elementos são os únicos a constituírem a matéria sacramental, muita razão teve a Igreja de proibir, por vários decretos, que se não oferecessem outras coisas, além do pão e do vinho, conforme alguns se atreviam de fazer.
V.3. Simbolismo da matéria
Agora, vamos ver quanto os símbolos de pão e de vinho se prestam para designar as coisas, de que são sinais sacramentais, consoante a nossa profissão de fé.
Em primeiro lugar, apresentam-nos Cristo como a verdadeira vida dos homens. Nosso Senhor em pessoa havia dito: "Minha Carne é verdadeiramente comida e Meu Sangue é verdadeiramente bebida". Ora, se o Corpo de Cristo Nosso Senhor dá alimento para a vida eterna aos que recebem o Seu Sacramento com o coração puro e santificado, de muito acerto é que o Sacramento tenha, por símbolo, as matérias que conservam a nossa vida terrena. Assim, os fiéis não custam a compreender que a Comunhão do Precioso Corpo e Sangue de Cristo lhes nutre, plenamente, a alma e o coração.
Estes elementos materiais também concorrem, não pouco, para que os homens venham a reconhecer que este Sacramento encerra, de fato, o Corpo e o Sangue de Nosso Senhor. Pois, ao vermos todos os dias que, por um processo natural, o pão e o vinho se convertem em carne e sangue do homem, mais facilmente chegamos a crer, mediante essa analogia, que a substância do pão e do vinho se convertem, pelas palavras da Consagração, na verdadeira Carne de Cristo e no Seu verdadeiro Sangue.
A admirável mutação dos elementos incute-nos, ainda, uma pálida noção daquilo que se opera na alma. Deveras, ainda que se não perceba nenhuma mudança exterior no pão e no vinho, contudo a sua substância passa, verdadeiramente, a ser Carne e Sangue de Cristo: assim também, de modo análogo, nossa vida se renova interiormente, quando recebemos a verdadeira vida no Sacramento da Eucaristia, posto que em nós parece não ter havido nenhuma mudança.
Mais ainda. Sendo a Igreja um corpo que se compõe de muitos membros, nenhuma coisa é mais adequada para fazer ressaltar essa união, do que o pão e o vinho. O pão se faz de muitos grãos, e o vinho se espreme de muitos cachos. Desta maneira, simbolizam como também nós, apesar de sermos muitos, nos unimos estreitamente pelos vínculos deste Mistério, e constituímos, por assim dizer, a unidade de um só corpo.
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