30 de abril de 2020

A ALMA DE TODO APOSTOLADO

J. B. Chautard


3 - A vida interior, base da santidade do obreiro apostólico.

Parte 1/7

Não sendo a santidade mais que a vida interior levada até à estreitíssima união da nossa vontade com a vontade de Deus, em via de regra e salvo um milagre de graça, a alma não atinge esse termo senão depois de ter percorrido, através de múltiplos e penosos esforços, todas as etapas da vida purgativa e iluminativa. Frisemos, como lei da vida espiritual que, no decurso da santificação, a ação de Deus e a da alma seguem marcha inversa: as operações de Deus assumem, de dia para dia, papel cada vez mais considerável, ao passo que a alma vai operando cada vez em menor escala.
Diferente é a ação de Deus nos perfeitos e nos que começam. Menos aparente nestes, provoca especialmente e ampara neles a vigilância e a súplica, oferecendo-lhes dessa sorte o meio de alcançarem a graça para novos esforços. Nos perfeitos, Deus opera de forma mais completa e às vezes até não exige mais que o simples consentimento que une a alma à sua ação suprema.
O principiante e mesmo o tíbio e o pecador que o Senhor quer aproximar de si, sentem-se primeiramente inclinados a procurar a Deus; depois, a provarem-lhe cada vez mais o próprio desejo de lhe agradar; finalmente, rejubilarem-se com todas as ocasiões providenciais que lhes permitam destronar o amor próprio, para porem em seu lugar unicamente o reino de Jesus. Neste caso, a ação divina limita-se a incitamentos, a auxílios.
No santo, é muito mais poderosa e muito mais completa esta ação. Em meio das fadigas e dos sofrimentos, abeberado de humilhações ou acabrunhado pela doença, basta, por assim dizer, que o santo se abandone à ação divina, sem a qual ele seria incapaz de suportar as agonias que, consoante os desígnios de Deus, devem servir de remate ao seu amadurecimento. Nele plenamente se realiza o texto seguinte: Deus subjecit sibi omnia ut sit Deus omnia in omnibus. Vive de tal sorte de Jesus que parece não mais viver por si mesmo. Este é o testemunho que de si deu o apóstolo: Vivo autem jam non ego: vivit vero in me Christus. Só o espírito de Jesus pensa, decide e opera. Certo que a divinização esta longe de atingir a intensidade que há de lograr na glória, contudo este estado já reflete os caracteres da união beatífica.
Julgamos inútil frisar que assim não sucede com o principiante ou o tíbio, e até com o simples fervoroso. A seus estados se adapta uma série inteira de meios que, de mais a mais, podem igualmente servir tanto a um como a outro. O principiante, porém, como qualquer aprendiz, há de molestar-se muito, avançará com lentidão e afinal há de desempenhar-se mediocremente de sua tarefa. O fervoroso, artista já adestrado, há de, por seu lado, executar depressa e bem sua tarefa e, com poucas dificuldades, há de granjear maiores proveitos.
Contudo, seja qual for a categoria de apóstolos de que se trate, invariáveis são sempre as intenções da Providência a respeito deles. Sempre e para todos, Deus quer que as obras sejam um meio de santificação. Mas, ao passo que, para a alma já chegada à santidade, o apostolado nenhum perigo sério oferece, nenhuma força a esgota e tudo lhe fornece abundantes ocasiões de crescer em virtude e e em méritos, vimos com que facilidade o apostolado causa a anemia espiritual e, portanto, o retrocesso no caminho da perfeição às pessoas fracamente unidas a Deus e nas quais pouco desenvolvimento tem ainda o gosto pela oração, o espírito de sacrifício e sobretudo a guarda habitual do coração.
Deus jamais recusa esse hábito à oração instante e a alma generosa que, mediante propósitos sempre renovados, foi pouco a pouco transformando as suas faculdades, tornando-as doceis às inspirações divinas e capazes de aceitar alegremente contradições e maus êxitos, perdas e decepções.

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