6 de abril de 2020

A ALMA DE TODO APOSTOLADO

J. B. Chautard

Parte 2/8

Chega, entretanto, o dia que se entreve o perigo: o anjo da guarda falou, a consciência reclama. Seria necessário, ter mão em si, examinar-se no sossego de um retiro, tomar a resolução enérgica de seguir à risca um regulamento que se não pusesse de lado, embora fosse mister descurar essas ocupações tão afagadas. Mas ai! é já tarde. A alma já saboreou o prazer de ver os seus esforços coroados pelos êxitos mais animadores: Amanhã, amanhã, exclama ela. Hoje é impossível; falta-me o tempo, porque devo continuar esta série de sermões, escrever este artigo, organizar este sindicato, esta associação de caridade, preparar esta récita, fazer esta viagem, pôr em dia a minha correspondência, etc . . . Como ela se sente feliz em poder tranquilizar-se com todos esses pretextos! Porque só o pensamento de encarar a sério sua consciência se lhe tornou insuportável. Chega o momento em que Satanás pode à vontade trabalhar em sua obra de ruína num coração que tão bem soube tornar-se seu cúmplice. O terreno esta preparado para isso. A sua vítima apaixonara-se pela ação; pois bem: Satanás instila-lhe a febre da ação. A sua vítima não podia suportar o esquecimento do tumulto dos negócios, o recolhimento; o demônio insufla-lhe horror de tudo isso e chega até a ponto de embriagar a alma com novos projetos, aos quais sabe habilmente dar as aparências de zelo pela glória de Deus e pela salvação das almas.
E esse homem, pouco havia ainda tão cheio de hábitos virtuosos, irá deslizando de fraquezas em fraquezas cada dia mais acentuadas, até chegar a pôr pé num declive tão resvaladio que não mais logrará sobrestar na sua queda. Digno realmente de lástima, tendo uma vaga consciência de que toda essa agitação não é conforme ao coração de Deus, atira-se, mais desatinadamente do que nunca para o turbilhão, a fim de sufocar os seus remorsos. As faltas vão-se fatalmente acumulando. O que outrora perturbava a consciência reta dessa alma, agora não são mais que vão escrúpulos que se desprezam. De bom grado proclama que é necessário saber ser homem de seu tempo, saber lutar com armas iguais às dos inimigos e por isso preconiza as virtudes ativas, tendo apenas palavras de desprezo para o que desdenhosamente chama piedade de outras eras. De mais a mais, as obras vão de vento em popa; o público aplaude-as. Cada dia vê desabrochar novos êxitos."Deus abençoa a nossa obra", exclama essa alma iludida, sobre a qual amanhã, talvez, devido a suas faltas graves, chorem os anjos do céu. 

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