12 de abril de 2022

MEDITAÇÃO PARA A TERÇA-FEIRA MAIOR

Caríssimos, eis que nesta Terça-feira Maior lemos a Paixão segundo São Marcos, companheiro de São Pedro. Nenhum outro evangelho relata a negação de São Pedro de maneira tão humilhante: esta é a humilde confissão do príncipe dos apóstolos.

Encontramo-nos diante da Passio beata, a feliz Paixão de Cristo. A glória da Ressurreição, que brilhará no final desta semana, já reluz com seus primeiros raios nas trevas da Semana Santa. Vejamos que todos os introitos desta semana manifestam a confiança e nos fazem ver, através dos sofrimentos da Cruz, a alegria da Ressurreição.

A coleta pede a remissão dos pecados em consideração dos "sacramenta Dominicae Passionis", os mistérios da Paixão do Senhor. E assim, caríssimos, imploramos ao Senhor a graça de nos prepararmos adequadamente para celebrar os mistérios da Paixão do Redentor, para dela tirar aquele fruto que a Igreja se propõe a si mesma na santa liturgia. Não se trata, evidentemente, uma simples comemoração cronológica, nem uma data histórica. Não, meus caros: as obras de Jesus, as suas palavras, contidas no santo Evangelho, têm sempre a sua própria eficácia, cada vez que são dignamente celebradas. A proclamação das santas leituras é um ato primeiramente sacrificial e não catequético! A santa Igreja, pelo seu culto, oferece a Deus um sacrifício de louvor e roga para os fiéis as graças que Cristo mereceu em seus mistérios! Assim, também aquela mesma virtude que possuíam aquelas obras de Cristo, quando, pela primeira vez, foram realizadas ou pronunciadas diante dos judeus, elas possuem ainda hoje, quando são repetidas pela Santa Romana Igreja em seu culto público. Por isso mesmo o diácono recebe a benção particular para anunciar o evangelho digna e competentemente, e com que reverência devemos nós ouvir as divinas perícopes!

Na epístola ainda ouvimos o profeta Jeremias, que é a figura do Cristo sofredor: "Fui, como um cordeiro manso, levado à imolação" e ouvimos também a voz dos inimigos: "Coloquemos lenha no seu pão ” (alusão misteriosa à morte na cruz e à Eucaristia). Jeremias, perseguido pelo sacerdócio corrupto de seu tempo, é um dos tipos proféticos mais parecidos com Jesus Cristo. Na passagem que a liturgia romana apresenta hoje, Jeremias apela ao juízo de Deus contra a iníqua trama de fixar o pão no patíbulo, o que, como observam os santos padres, é uma expressão profética que prenuncia o milagre eucarístico onde, sob a espécie do pão se encontra realmente o corpo do Senhor.

Os três cantos que se seguem no próprio (Gradual, Ofertório e Comunhão) são queixas da boca de Cristo. Eis, pois, diante de nós, o doloroso sacrifício de Cristo e levamos a memória de sua morte durante todo o dia. O gradual é retirado do Salmo 34, onde Cristo manifesta toda a ingratidão de seus adversários. Ele os amou tanto que, quando estavam doentes (as doenças da alma são os pecados e a febre das paixões desordenadas) vestiu um pano de saco, isto é, cobriu a glória de sua divindade com a humildade de sua humanidade, e mortificou o seu espírito com jejum. No entanto, seus inimigos responderam com ódio ao seu amor, e é por isso que Jesus se dirige ao Pai e diz: “Julgai, ó Senhor, meus adversários, atacai meus agressores; pegai o escudo e a égide e vinde em meu auxílio”.

Hoje canta-se a Paixão segundo São Marcos, que outra coisa não é senão a pregação de São Pedro. Como observam os exegetas, esse jovem de quem se fala, subitamente despertado pelo tumulto e pelo anúncio da prisão de Jesus, era provavelmente o próprio autor do Evangelho, Marcos, que, sem nomear-se diretamente, no entanto, coloca uma espécie de assinatura ao seu Evangelho escrito. São Marcos morava de fato com sua mãe em Jerusalém fora dos bairros habitados, de modo que os primeiros fiéis fizeram de sua casa seu ponto de encontro. Quando Jesus passou em frente à sua morada, o jovem já estava descansando e, segundo o costume palestino, tendo despido as roupas do dia, havia se enrolado em um grande lençol, que é indicado no texto como sendo do linho mais fino, já que eram de fato pessoas ricas. Com o barulho das tropas, ele acorda e, ao saber que Jesus, capturado, estava passando, corre como estava, sai de casa e começa a  discutir com os legionários, realizando até ameaças. Tentam agarrá-lo, mas o jovem, ágil, deixa o lençol na mão e se afasta. Como observa São Gregório Magno, quem quiser escapar da violência do demônio deve primeiro proceder a um perfeito desnudamento interior, como fazem os atletas na arena; é necessário que o demônio não tenha domínio sobre nós e devemos, portanto, abandonar de boa vontade os bens materiais para ele, a fim de resgatar a nossa alma de suas garras.

Deve-se observar que quando, na Sagrada Escritura, a vingança divina é invocada sobre os ímpios, isso deve ser entendido como o último julgamento de Deus após a impenitência final do pecador, ou então, se a frase se refere à vida presente, males físicos e temporais que Deus, na maioria das vezes, envia aos ímpios ainda neste mundo, seja para incitá-los a se afastar do mal e convertê-los, ou mesmo para privá-los da oportunidade de cometer novos pecados e correr mais certamente assim para sua condenação eterna.

Que o Senhor faça resplandecer o seu rosto sobre nós e nos mostre a sua misericórdia! Tal é o belo salmo messiânico que a Igreja, nestes dias, aplica aos triunfos do Crucificado. Com efeito, é do alto do patíbulo da infâmia que Jesus, segundo a sua própria palavra, levantado da terra, atrai a si todas as almas. É da Cruz que ele dirige seus olhos sofredores e amorosos para a humanidade que, ao longo dos séculos, desfila diante dele, e faz jorrar sangue e água para a salvação dos homens.

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