5 de março de 2011

ENCONTRAR MARIA (I)

Como saudar a gloriosa Virgem

1) Apesar de eu não ter mérito algum e, ao contrário, ser consciente de meus muito numerosos pecados, tenho, no entanto, grandíssima confiança em sua paixão, Senhor Jesus, e nos méritos da gloriosa Santa Virgem Maria, vossa Mãe. A propósito dela quisera deter-me um pouco, rogando chegar a ser digno, já que não posso atrever-me a aproximar-me de sua pessoa sem haver obtido antes sua permissão. Bem sei que minha indignidade não devia apresentar-se ante a excelsa dignidade daquela que os mesmos anjos veneram com admiração, exclamando: “Quem é esta que se eleva sobre o deserto do mundo e está cheia das delícias do paraíso?"

2) Por isso, dulcíssima Maria, é inconveniente que eu, pó e cinza, ou melhor, mais vil que o pó por ser pecador e muito propenso a toda perversidade, me atrevo a deter-me para considerar sua beleza e sua magnificência. Tu, por outro lado, elevando-se sobre o céu, tem o mundo sob os pés e és digna de honra e reverência pela honra de seu Filho. Sua inefável bondade, que excede toda imaginação, com freqüência me fascina e atrai meu afeto, porque és o consolo dos aflitos e estás sempre disposta a socorrer os miseráveis pecadores.

3) Estou necessitado de grande consolo, sobretudo da graça do vosso Filho, pois não me encontro em absoluto em condições de ajudar a mim mesmo. Porém tu, Mãe misericordiosíssima, se te dignais considerar minha pequenez, de muitas maneiras poderia me socorrer e me confortar com abundantes consolos. Por isso, apenas me sinta oprimido pelas dificuldades ou pelas tentações, imediatamente recorrerei a ti, posto que onde existe superabundância de graça é mais solicita a misericórdia.

4) Logo, se quero realizar o intento de compreender tua glória excelsa e saudar-te dignamente desde o íntimo do coração, devo proceder com espírito muito mais puro, porque os que pretendem aproximar-se sem respeito a tua porta, não obtêm glória senão vergonha. Portanto, quem se aproxima de ti deve comportar-se com grandíssima reverência e humildade, no entanto, com grande esperança de ser admitido em virtude de tua misericordiosa clemência.

5) Por conseguinte, vou a ti com humildade e reverência, com devoção e confiança, levando nos lábios a saudação de Gabriel, que te dirijo suplicante: saudação que repito com alegria, com a cabeça inclinada por respeito e os braços abertos com grande devoção, rogando que seja repetido em meu lugar cem, mil e mais vezes ainda por todos os espíritos celestiais. Não sei realmente o que possa haver mais doce e mais digno para oferecer-te.

6) E agora escuta também ao devoto enamorado de teu nome: “O céu se regozija e a terra se assombra, quando digo Ave Maria. Satanás foge, o inferno treme quando digo Ave Maria. O mundo se torna desprezível, a carne repugnante, quando digo Ave Maria. Desaparece a tristeza e volta a alegria quando digo Salve Maria. Aumenta a devoção, nasce a compunção, se acrescenta a esperança, se intensifica o consolo, quando digo Salve Maria. O ânimo se renova e se reforça o empenho no bem, quando digo Ave Maria.

7) É tão grande a doçura desta bendita saudação, que não admite explicação com palavras humanas. Resulta em efeito sempre mais elevado e profundo do que possa compreender toda a criatura. Por isso dobro uma vez mais os joelhos diante de ti, Santíssima Virgem Maria, e digo: “Ave Maria cheia de graça”. Clementíssima Senhora minha, Santa Maria, aceita esta tão devota saudação e, com ela, aceita também a mim, para que eu possa ter algo que seja de teu agrado, que fortaleça minha confiança em ti, que acenda em mim um amor cada vez maior e me conserve para sempre devoto de seu santo nome.

8) Queira o céu que, para satisfazer o meu desejo de honrar-te e de saudar-te eternamente desde o fundo do coração, todos meus membros se transformem em línguas e as línguas em vozes de fogo. Mãe de Deus, quisera poder dirigir-te esta saudação como pura e santa oferenda de oração, em expiação de todas as minhas culpas, pelas quais tenho merecido a ira divina, tenho entristecido gravemente a teu Filho, tenho desonrado e ofendido muito freqüentemente a ti assim como toda a corte celestial.

9) Dado que a minha vida é frágil e caduca a causa de todos os meus excessos, de todas as minhas negligências, de todos os pensamentos vãos, imundos e perversos, queira o céu que todos os espíritos bem-aventurados e as almas dos justos, com puríssima devoção e muito ardente oração, te dirijam, ó Beatísima Virgem Maria, e repitam cem vezes em tua honra a altíssima saudação com que o Pai, o Filho e o Espírito Santo foram os primeiros em querer saudá-la por meio do anjo. De alguma maneira, acharia assim um digno incenso de suave fragrância já que em mim nada há de bom nem nada me mereça recompensa.

10) Mas agora eu me prostro diante de ti, impulsionado por sincera devoção e totalmente incendiado em veneração para com seu suave nome, te repito o gozo daquela nova saudação, jamais ouvida até então, quando o arcanjo Gabriel, enviado por Deus, entrou na intimidade de tua morada e, dobrando reverentemente os joelhos, te rendeu honra ao dizer-te: “Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo”. Eu desejo, em consonância com o precioso costume dos fiéis e, em todo o possível, com lábios puros, dirigir-te esta saudação, como também desejo, desde o fundo do coração, que te dirijam do mesmo modo todas as criaturas: “Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo. Bendita és tu entre todas as mulheres e bendito é o fruto de teu ventre, Jesus Cristo. Amém”.

11) Esta é a saudação angélica, composta por inspiração do Espírito Santo, totalmente adequada à tua dignidade e santidade. É uma oração pobre em palavras, mas rica em mistérios. Breve como discurso, porém profunda em conteúdo, mais doce do que o mel e mais preciosa do que o ouro, digna de se repetir com muita freqüência de todo coração, devotamente e com lábios puros, porque, mesmo que seja resultado de muito poucas palavras, se propaga em uma vastíssima torrente de celestial suavidade.

12) Mas ai daqueles que se entediam, que a rezam sem devoção, que não refletem sobre suas palavras mais valiosas que o ouro, que não saboreiam seus favos de mel, que tantas vezes recitam a Ave Maria sem atenção nem respeito. Ó dulcíssima Virgem Maria, livrai-me de uma tão grande negligência e desatenção, perdoa o meu desempenho no passado. Serei mais devoto, mais fervoroso e mais atento ao recitar a Ave Maria, qualquer que seja o lugar onde possa me encontrar.

13) Agora, depois dessas considerações, o que te pedirei, minha muito querida Senhora? Para mim, indigno pecador, há algo melhor, mais útil, mais necessário do que achar graça diante de ti e de teu amadíssimo Filho? Portanto, peço a graça de Deus por tua intercessão, já que, como afirma o anjo, encontraste a plenitude da graça diante de Deus.

14) Nada do que peça é mais precioso do que a graça, nem tenho necessidade de nenhuma outra coisa fora ela e a misericórdia de Deus. Basta-me tua graça, não necessito de mais nada: sem a graça, em efeito, que resultado teria qualquer esforço meu? Em vez disso, o que pode ser impossível para mim se me assiste e me ajuda a graça? Tenho muitos e diferentes defeitos espirituais, mas a graça de Deus é um remédio eficaz contra todas as paixões, e se Ele se dignar a socorrer-me, atenuará a todos.

15) Sofro assim mesmo de pobreza em sabedoria e em ciência espiritual, mas a graça de Deus é a suprema mestra e dispensadora da disciplina celestial. Por conseguinte, ela me basta para instruir-me em todos os assuntos necessários, e me dissuade de buscar qualquer coisa fora do imprescindível, e de querer conhecer temas para além do que é lícito. Porém, admoesta e ensina a humilhar-se assim como contentar-se somente com ela.

16) Pela mesma razão, ó clemente Virgem Maria, obtenha-me com suas orações esta graça que é tão nobre e tão preciosa: que eu não deseje nem peça mais do que a graça pela graça.

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de Maria nunquam satis"
"sobre Maria nunca se falará o bastante"

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(KEMPIS, Tomás de. Imitación de Maria: Libro Primero, Capítulo I. pag. 11 - 17.)

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