[Sermão] Ecologismo e ambientalismo?
Sermão para o Quarto Domingo depois de Pentecostes
02 de junho de 2013 – Padre Daniel Pinheiro
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave-Maria…
***
“Sabemos que todas as criaturas gemem e estão como que em dores de parto.”
Caros católicos, temos, na Missa de hoje,
esse trecho da Epístola de São Paulo aos Romanos que nos fala dos
gemidos e da ânsia das criaturas para se libertarem da sujeição da
corrupção, e que poderíamos chamar de ecologia católica. Uma leitura
apressada poderia nos fazer crer que São Paulo é um ecologista ou
ambientalista de nossos tempos, preocupado com a natureza que sofre
diante da perspectiva de esgotar-se, mal tratada pelo homem que se
utiliza dela. Poderíamos pensar que o Apóstolo São Paulo é daqueles que,
não contentes de estabelecer a oposição violenta da luta de classes
entre ricos e pobres (marxismo ordinário), entre homem e mulher
(feminismo), entre superiores e inferiores (entre pais e filhos, entre
professores e alunos, etc.) estabelecem também uma oposição violenta
entre o homem e o resto da criação, como faz o ecologismo ou
ambientalismo de nossos dias.
Ora, é claro que não deve existir
oposição entre ricos e pobres, mas cooperação, cada membro do corpo da
sociedade exercendo a função que lhe cabe para o bem do corpo inteiro.
Não deve existir oposição entre homem e mulher, mas complementaridade,
cada um praticando bem o seu papel na família e na sociedade, conforme a
especificidade dada por Deus a cada um dos sexos. Também é evidente que
não deve haver oposição entre pais e filhos, superiores e inferiores.
Os superiores devem governar para o bem dos inferiores, para o bem comum
e os inferiores devem obedecer. Da mesma forma, não há oposição entre o
homem e o resto da natureza. Para entendermos bem essa frase de São
Paulo – “sabemos que todas as criaturas gemem como que em dores de parto”
– para entendermos o que é esse sofrimento das criaturas de que fala
São Paulo, precisamos compreender primeiramente o que é sofrer.
Se a felicidade consiste em possuir um
verdadeiro bem que desejamos, a tristeza ou o sofrimento consiste
justamente na privação desse bem desejado, ou no fato de que o bem
possuído é atacado. Por exemplo, aquele que deseja a salvação das almas
se alegra ao ver a conversão das almas, mas sofre ao ver que as almas
pecam ou que elas são atacadas pelos mais diversos inimigos. São Paulo
diz que as criaturas sofrem, gemem. Isso significa que elas estão sendo
privadas do bem delas. Ora, o bem de cada coisa é alcançar a sua
finalidade e também tudo o que pode levar a essa finalidade. Assim, o
bem do homem é alcançar a vida eterna, pois foi para isso que fomos
criados, e é bom para nós tudo o que pode nos ajudar a alcançar essa
vida eterna. Como sabemos, Deus criou todas as coisas para que as
perfeições divinas fossem manifestadas pelas criaturas. A finalidade das
criaturas é dar glória a Deus, manifestando, por suas perfeições
limitadas, a perfeição infinita de Deus. A finalidade das criaturas
irracionais é manifestar a perfeição infinita divina e levar os homens a
reconhecerem e louvarem a Deus e servir aos homens para que os homens
sirvam melhor Deus. Como cantamos no Sanctus: os céus e a terra
estão cheios de sua glória. O bem das criaturas irracionais é manifestar
as perfeições divinas. O bem delas consiste mais precisamente em servir
ao homem para que, por meio delas, o homem possa conhecer melhor as
perfeições divinas e para que o homem as submeta, a fim de poder servir
melhor a Deus. Por exemplo, podemos dizer que a uva alcança de modo
sublime a sua finalidade e o seu bem quando ela é utilizada para a
fabricação do vinho que servirá para a Missa. Podemos dizer que a
madeira ou a pedra alcançam seu bem perfeitamente, quando nelas se
realiza o santo sacrifício do altar. Podemos dizer que a água alcança a
sua finalidade ao matar a sede do homem, ou como meio para assegurar a
limpeza, etc… Portanto, o bem das criaturas consiste em servir ao homem
para que o homem possa servir melhor a Deus. Uma árvore sozinha no meio
do mato daria pouca glória a Deus. Uma árvore que se torna conhecida do
homem e que pela sua beleza leva o homem até Deus, dá maior glória a
Deus. Uma árvore que dá ao homem o alimento para que ele tenha forças
para praticar o bem dá grande glória a Deus. Uma árvore que fornece a
madeira para o altar dá uma glória sublime a Deus. Deus disse ao criar o
homem: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança. Que
ele reine sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus, sobre os
animais domésticos e sobre toda a terra, e sobre todos os répteis que se
arrastem sobre a terra.” (Gênesis I, 26). Reinar é governar e
ordenar as criaturas irracionais em vista do nosso bem, que são nossas
necessidades e, sobretudo, a nossa salvação.
Tal governo e ordem existiam
perfeitamente quando Deus criou o homem. Quando Deus criou o homem, ele
criou o homem no que se chama estado de justiça original. No estado de
justiça original, o homem foi criado em estado de graça. Ao estado de
graça estavam vinculados outros quatro dons gratuitos, que também
superam as exigências da nossa natureza: 1) o dom da imortalidade (o
homem não podia morrer), 2) o dom da impassibilidade (o homem não podia
sofrer, nem no corpo, nem na alma), o 3) dom da ciência infusa (Deus deu
a Adão toda a ciência necessária para que ele pudesse governar bem os
filhos e a natureza, sem precisar aprender pela experiência, ao
contrário de nós, que aprendemos aos poucos e somos, no início de nossa
existência, como uma tábua rasa). Falamos de três dons. O quarto dom era
o dom da integridade. Pelo dom da integridade, tudo estava
perfeitamente ordenado no homem, o inferior ao superior. Dessa forma, a
inteligência e a vontade estavam perfeitamente submetidas a Deus. As
paixões, os sentimentos, estavam perfeitamente submetidos à inteligência
e à vontade. Assim, Adão e Eva não desejavam comer mais do que o
suficiente, não precisavam de roupas, pois não tinham tentações contra a
pureza, etc. Vale lembrar que o pecado original não podia ser um
pecado de concupiscência, mas somente um pecado de orgulho, pois Adão e
Eva, em virtude do dom de integridade não podiam cometer pecados desse
gênero. O pecado original foi um pecado de orgulho, pelo desejo de ser
como deuses, empregando outros meios do que os meios dados por Deus. A
inteligência e a vontade estavam submetidas a Deus. As paixões e
sentimentos à inteligência e à vontade. O corpo estava submetido à alma.
Os seres irracionais também estavam perfeitamente submetidos ao homem,
que só os utilizava bem, que reinava sobre eles, em conformidade com a
lei natural e com a lei divina. Mesmo os animais selvagens e ferozes
eram submissos ao homem, como animais domesticados. Portanto, nos estado
de justiça original, toda a criação estava perfeitamente submetida ao
homem, que, por sua vez, estava perfeitamente submetido a Deus. A
criação cumpria a sua finalidade perfeitamente: servir ao homem para que
o homem servisse a Deus. O homem só usava com virtude a criação, sempre
tendo Deus por finalidade. Todavia, todos esses dons dados por Deus
estavam vinculados e eram dependentes do dom mais importante, que era a
graça santificante. Ao cometer o pecado original, Adão e Eva perderam
para si e para seus descendentes (todos os homens) não só a graça, mas
todos os outros quatro dons: perderam o dom da imortalidade, o dom da
impassibilidade, o dom da ciência, o dom da integridade. Depois do
pecado, o homem está sujeito à morte, à dor e aos sofrimentos. A
inteligência e a vontade se inclinam respectivamente para o erro e para o
mal, as paixões tendem a se revoltar contra a razão e a vontade, as
criaturas só podem ser dominadas com esforço. Depois do pecado original,
podemos, pela bondade divina, recuperar a graça, mas não temos os
outros dons e não temos direito a eles, pois haviam sido dados
gratuitamente por Deus. Depois do pecado original, perdido o dom de
integridade, o homem começa a usar – muitas vezes – mal as criaturas,
que foram colocadas sob o seu domínio. Em vez de usá-las para a glória
de Deus, utiliza-as para ofendê-lo, para cometer pecados e facilitar os
pecados.
Caros católicos, quando São Paulo diz que
a criação geme e está sujeita à corrupção, é no sentido de que ela é
desviada do fim para que foi criada, no sentido de que ela é desviada
pelo homem do bem dela, que é justamente servir ao homem para que ele
sirva a Deus. São Paulo não quer dizer em nenhum momento que a natureza é
uma entidade dotada de personalidade, ou que a natureza se confunde com
a divindade, ou que nós formamos junto com a natureza um todo divino e
vital. Muito se diz atualmente que devemos buscar a harmonia com a
natureza. Devemos estar plenamente de acordo com isso, pois harmonia
quer dizer ordem e a ordem natural significa sujeição do inferior ao
superior. O solo é usado pelas plantas, para a nutrição delas. As
plantas pelos animais. As plantas e os animais pelo homem. É, portanto,
natural que o homem domine sobre as criaturas irracionais. E, por isso, o
Filósofo – Aristóteles – diz que a caça de animais é justa e natural,
pois pela caça o homem simplesmente reivindica o que lhe pertence
naturalmente: o animal para a sua alimentação. A harmonia com a
natureza quer dizer, então, que o homem deve dominá-la e usá-la para o
seu bem, em última instância usá-la para servir melhor a Deus. Portanto,
o ecologismo ou o ambientalismo, que eleva a natureza ao grau de
divindade ou que prefere preservar a natureza a preservar o homem – ao
ponto de ser melhor abortar do que ter mais um ser humano na terra, que
irá comer plantas e carne de animais – é uma grande desarmonia e falta
de sintonia com a natureza. Respeitar a natureza, como se ela contivesse
uma partícula da divindade ou como se fosse o próprio Deus, respeitá-la
como se ela estivesse acima do homem, respeitá-la como se ela fosse a
nossa mãe – a “mãe natureza” – ou virar vegetariano por respeito aos
animais e à natureza é violar a ordem estabelecida por Deus e é desviar
as criaturas irracionais da sua finalidade: servir o homem para que ele
possa servir melhor a Deus. Os católicos podem deixar de comer carne,
claro, mas é por penitência e não por respeito aos animais.
Sem dúvida, é preciso dominar e usar das
criaturas racionais com prudência, mas não em virtude delas mesmas, e,
sim, em razão de nosso bem e do bem de nossos descendentes. Assim, por
exemplo, pode ser melhor preservar uma determinada área florestal ou
determinada espécie de animal, não por simples respeitou e devoção a
eles, mas para que pela contemplação dessas coisas possamos chegar até o
autor delas, que é a Santíssima Trindade. Em todo, caso, não devemos
nos preocupar demasiadamente com isso: “buscai primeiro o reino de Deus e tudo o mais vos será acrescentado”.
Quantas vezes falsos profetas avisaram da escassez de alimentos e de
recursos, caso a população humana continuasse crescendo, e com isso
justificaram a contracepção, a destruição da família? Jamais faltou
alimento e jamais faltará, por mais que a população cresça. Se Deus
alimenta até mesmo as aves do céu, quanto mais os homens que buscam
viver segundo a sua lei? Além disso, Deus deu ao homem a inteligência,
capaz de encontrar soluções impressionantes.
Portanto, caros católicos, a natureza
geme, em sentido figurado, porque a utilizamos mal e não porque ela
sofre como um ser vivo, ou porque ela é desrespeitada, ou porque ela tem
os mesmos direitos que nós. Não, ela sofre porque é usada contra a
finalidade para a qual foi criada, que é dar maior glória a Deus, sendo
utilizada retamente pelo homem. Devemos, então, caros católicos,
utilizar as criaturas irracionais para o nosso bem, para o bem do
próximo e para a maior glória de Deus, para que Ele seja mais conhecido e
melhor servido.
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.
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