1 de março de 2009

Doutrina Trinitária no Concílio de Toledo, 675

Este pequeno Concílio local, com a presença de somente 17 bispos, tem pouca significância hoje exceto pela bonita profissão de fé que recitou na sua abertura. O valor oficial desse documento consiste no fato de que nos séculos seguintes for mantido na altíssima estima e considerado uma expressão genuína da fé trinitária; é uma das importantes fórmulas de doutrina. De fato, em mui poucos lugares há a reflexão da Igreja antiga sobre o mistério da Trindade e uma expressão de Cristo tão precisa e acurada quanto neste Credo, que une a tradição dos primeiros Concílios à teologia patrística do Ocidente.

Confessamos e cremos que a santa e inefável Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo, é um único Deus por natureza, de uma única substância, de uma única natureza assim como de uma única majestade e poder.

E professamos que o Pai não é gerado, nem criado, mas incriado. Porque Ele por Si mesmo, de Quem o Filho recebeu Sua geração e o Espírito santo, a Sua processão, não deve Sua origem a ninguém. Ele é, portanto, a fonte e origem de toda a Divindade. Ele mesmo é o Pai de Sua própria inefável substância. E, ainda, Ele não gerou nada além do que Ele mesmo é: Deus gerou Deus; a luz gerou a luz. A Ele, então, pertence toda a paternidade nos céus e na terra. (Ef. III 15)

Também confessamos que o Filho for gerado, mas não feito, da substância do Pai, sem um começo, antes de todos os séculos, porque não houve tempo em que o Pai existisse sem o Filho, nem o Filho sem o Pai. E, ainda, o Pai não provém do Filho como o Filho, do Pai, porque o Pai não foi gerado pelo Filho, mas o Filho o foi pelo Pai. O Filho, portanto, é Deus [provindo] do Pai, e o Pai é Deus, mas não [provindo] do Filho. Ele é deveras o Pai do Filho, não Deus do Filho; mas Esse último é Filho do Pai e Deus do Pai. Mais ainda: em todas as coisas, o Filho é igual a Deus Pai, porque Ele nunca começou nem terminou de ser gerado. Também cremos que Ele é de uma só substância com o Pai, porquanto é chamado "homoousios" com o Pai, isto é, do mesmo ser que o Pai, porque "homos" em grego significa "um", e "ousia" significa "ser", e, juntos, significam "uno na essência". Devemos crer que o Filho é gerado ou nascido não do nada ou de qualquer outra substância, senão do seio do Pai, isto é, da Sua substância. Portanto, o Pai é eterno, e o Filho também é eterno. Se Ele sempre foi Pai, Ele sempre teve o Filho, Cujo Pai Ele é, e assim confessamos que o Filho nasce do Pai sem um começo. Não chamamos Esse Filho de Deus uma parte de uma natureza dividida, porque Ele foi gerado do Pai, mas afirmamos que o Pai, perfeito, gerou o Filho, perfeito, sem diminuição ou divisão, porque é propriedade somente da Divindade não ter um Filho desigual. Esse Filho de Deus é também Filho por natureza, não por adoção; d'Ele também devemos crer que Deus Pai não O gerou por um ato de vontade nem por necessidade, porque em Deus não há necessidade, nem a vontade precede a sabedoria.

Também cremos que o Espírito Santo, a terceira pessoa da Trindade, é Deus, uno e igual a Deus Pai e
Filho, de uma substância e uma natureza, não, porém, gerado, nem criado, mas procedente de ambos, e Ele é o Espírito de ambos. D'Esse Espírito Santo também cremos que não é nem incriado, nem criado, porque se o chamássemos incriados, afirmaríamos haver dois Pais, ou, se gerado, pareceríamos pregar dois Filhos. Além disso, Ele não é chamado Espírito somente o Pai, nem somente do Filho, mas de ambos, Pai e Filho. Porque Ele não procede do Pai para o Filho, nem do Filhio para santificar as criaturas, mas se evidencia que procede de ambos de uma só vez, porque é conhecido como o amor ou a santidade de ambos. Daí cremos que o Espírito Santo é enviado por ambos, assim como o Filho é enviado pelo Pai. Mas Ele não é menos do que o Pai e o Filho, da maneira como o Filho, em relação ao corpo que assumiu, testemunha ser menos do que o Pai e o Espírito Santo.

Esse é o modo como se deve falar sobre a Santíssima Trindade conforme foi ensinado: não se deve chamá-la ou crê-la tripla, mas Trindade. Nem é próprio dizer que no Deus único há a Trindade, mas sim que o Deus único é a Trindade. Nos nomes relativos das pessoas, Pai se refere ao Filho, Filho se refere ao Pai, e Espírito Santo, a ambos. Enquanto são chamadas três pessoas com vistas às suas relações, cremos em uma só natureza ou substância. Por outro lado, professamos três pessoas, e não professamos três substâncias, mas uma substância e três pessoas. Porque o Pai e Pai não a respeito d'Ele mesmo, das do Filho; e o Filho é Filho não por Si mesmo, mas em relação ao Pai; e, da mesma forma, o Espírito Santo não se refere a Si mesmo, mas se refere ao Pai e ao Filho, porquanto é chamado Espírito do Pai e do Filho. Então, quando dizemos "Deus", isso não expressa uma relação a outro, como é a do Pai ao Filho ou do Filho ao Pai ou do Espírito Santo ao Pai e ao Filho, senão que "Deus" só se refere a Ele mesmo.

Por isso, se formos interrogados sobre cada uma das pessoas [da Santíssima Trindade], devemos confessar que cada uma é Deus. Portanto, dizemos que o Pai é Deus, o Filho é Deus, o Espírito Santo é Deus cada um distintamente; porém não há três deuses, mas um Deus. Semelhantemente, dizemos que o Pai é onipotente, o Filho é onipotente, o Espírito Santo é onipotente, cada um distintamente; porém, não há três onipotentes, mas um Onipotente, assim como professamos uma luz e um princípio. Portanto, confessamos e cremos que cada pessoa distintamente é plenamente Deus, e que as três pessoas juntas são um Deus. D'Elas é uma igual e indivisível Divindade, majestade e poder, que não é nem diminuída em cada pessoa sozinha, nem aumentada nas três juntas. Porque não é menos quando cada pessoa é separadamente chamada Deus, nem é maior quando todas as três pessoas são chamadas um único Deus.

Essa Santíssima Trindade, que é o Deus uno e verdadeiro, não é sem número; porém, não é compreendida pelo número, porque nas relações das pessoas aparece o número, mas na substância da Divindade nada de contável é compreendido. Portanto, Elas implicam em número somente à medida que Se relacionam mutuamente, mas Lhes falta número enquanto são compreendidas por Si mesmas. Por isso, a Santíssima Trindade só tem um nome com referência a sua natureza, de forma que não pode ser usada no plural, como se fosse com referência às três pessoas. Esse é, então, na nossa fé, o significado do que diz a Sagrada Escritura: "Grande é o nosso Deus, abundante em poder, e não há número da Sua sabedoria" (Sl CXLVII (CXLVI) 5).

Porém, embora tenhamos dito que Essas três pessoas são um único Deus, não se nos permite dizer que a mesma [pessoa] Que é o Pai seja o Filho, ou Aquela Que é o Filho, seja o Pai, ou que Aquela Que é o Espírito Santo seja o Pai ou o Filho. Porque não é o Pai Aquele Que é o Filho, nem é o Filho Aquele Que é o Pai, nem é o Espírito Santo Aquele Que é o Pai ou o Filho, muito embora o Pai seja Aquilo que o Filho é, o Filho seja aquilo que o Pai é, e Pai e o Filho sejam aquilo que o Espírito Santo é, a saber: um único Deus pela natureza. Por isso, quando dizemos: Aquele Que é o Pai não é o Filho, referimo-nos à distinção das pessoas; mas, quando dizemos: O Pai é Aquilo Que o Filho é, o Filho, Aquilo Que o Pai é, e o Espírito Santo, Aquilo Que o Pai e o Filho são, isso claramente se refere à natureza ou substância, porque Deus existe enquanto [as três pessoas] são um em substância; porque distinguimos as pessoas, mas não dividimos a Divindade.

Logo, reconhecemos a Trindade na distinção das pessoas, e professamos a unidade levando em conta a natureza ou substância. Assim, os três são um por natureza, e não enquanto pessoa.

Além disso, nenhuma d'Essas três pessoas devem ser consideradas separáveis, porque, de acordo com a nossa crença, nenhuma d'Elas jamais existiu ou agiu antes de outra, depois de outra, ou sem outra. Porque Elas são inseparáveis tanto no Que Elas são, quanto no que Elas fazem, pois, segundo a nossa fé, entre o Pai Que gera e o Filho Que é gerado, ou o Espírito Santo Que procede, não houve um intervalo de tempo em que Aquele Que gera precederia Aquele Que é gerado, ou durante o qual não haveria um gerado para Aquele que gera, nem que o Espírito Santo, em Sua procedência, apareceria depois do Pai ou do Filho. Por essa razão nós professamos e cremos que Essa Trindade é inseparável e distinta (inconfusa). Dizemos, portanto, dessas três pessoas, como nossos antepassados o definiram, que devem ser conhecidas, e não separadas. Porque, se ouvirmos o que a Sagrada Escritura diz a respeito da Sabedoria: "Ela é um reflexo da luz eterna" (Sb VII 26), vemos que, como o reflexo pertence inseparavelmente à luz, assim também, de acordo com a nossa confissão, o Filho não pode ser separado do Pai. Portanto, nem confundimos Essas três pessoas Cuja natureza é una e inseparável, nem pregamos que sejam de forma alguma separáveis.

A própria Santíssima Trindade Se dignou revelar-no-lo claramente: nesses nomes pelos quais Deus quis que cada pessoa fosse conhecida, é impossível entender uma pessoa sem a outra; não se pode conceber o Pai sem o Filho, nem o Filho pode ser entendido sem o Pai. De fato, as relações expressas nos nomes pessoais nos proíbem de separar as pessoas, porque, mesmo que [cada nome] não as nomeie todas juntas, assim as implica. Ninguém pode ouvir nenhum desses nomes sem necessariamente entender também os demais. Então, enquanto Esses Três são Um e esse Um, Três, cada uma das pessoas retém Suas próprias propriedades: O Pai tem a eternidade sem nascimento; o Filho tem a eternidade com nascimento; o Espírito Santo tem a processão sem nascimento com a eternidade.

Tradução de: http://www.fordham.edu/halsall/source/toledo.txt.

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