2 de janeiro de 2022

Resposta à Carta aos fiéis de Dom José Antônio Peruzzo - Arcebispo de Curitiba

          Nos dias que antecedem à festa do Natal, excelência da misericórdia, da mansidão e da humildade que se fez Carne, os fiéis brasileiros adeptos à forma antiga do Rito da Missa, até recentemente considerada parte extraordinária dos Ritos Católica[1], veem diante de si o cair de um golpe inflamado de furor, provindo daquele que deveria ser o alento do povo, o pilar da justiça e da caridade, a saber, o Arcebispo Metropolitano de Curitiba, Sua Excelência Reverendíssima Dom José Antônio Peruzzo.

Em nota[2], sinuosamente auto defensiva e ofensiva, o Arcebispo inicia clamando a obediência, hoje usada para calar aqueles que ousam questionar as ações do clero – isso se forem católicos, pois a liberdade religiosa e de expressão é livremente defendida e incentivada para com os irmãos protestantes e de outras igrejas –, citando o Decreto Christus Dominus[3], de Sua Santidade, o Papa João Paulo II.  Esquece-se, entretanto, que o mesmo Decreto solicita aos Bispos que “comportem-se no meio dos seus como quem serve”[4]. Dom Peruzzo lembra da obediência, mas oculta a sua premissa. Os bispos, continua o Decreto, devem, “como bons pastores que conhecem as suas ovelhas e por elas são conhecidos como verdadeiros pais que se distinguem pelo espírito de amor e de solicitude para com todos, de modo que todos se submetam facilmente à sua autoridade recebida de Deus”[5].

Ora, o bom pastor deve ser solícito e, esta ação de caridade, no apostolado do Arcebispo de Curitiba para com o Instituto Bom Pastor, não fora deflagrada. Dom Peruzzo, às claras, jamais visitara os leigos do Apostolado; jamais ouvira as suas necessidades. Ao contrário, assistiu com inércia a procura do Instituto por locais adequados para a Celebração da Santa Missa; recebera com relutância as preces dos fiéis leigos que clamaram por compreensão, ao irem ao seu encontro, como filhos ao pai; enrubescera e os interrompera, antes de os ouvir; suportou a contragosto o Instituto, até a recente publicação da Traditionis custodes[6]. A Igreja em saída, a que ouve e acolhe os que precisam está, certamente, nos lemas e nas cartilhas das reuniões do clero, sem estar, tampouco, espelhado em suas ações.  

Com a autoridade destacada pelo mesmo Arcebispo, citando o Motu Proprio de Sua Santidade, o Papa Francisco, acerta em dizer que lhe foi constituída o poderio em delimitar as celebrações litúrgicas em suas dioceses e escolher os padres que celebrarão a Missa no rito antigo. Não há discussão neste ponto. A pergunta que fazemos, na verdade, é a intenção e motivação do Arcebispo em proibir, na calada da noite, a existência e autonomia de um apostolado já instalado e estruturado em sua Diocese. Que medo ou, antes, que escândalo causou o Padre do Instituto Bom Pastor em sua estadia em Curitiba, para ter os poderes de seu ministério cerceados? Que mal fizeram à Igreja os fiéis de Curitiba, que ver-se-ão desprovidos e apartados do pai espiritual que tantas graças lhes concedeu com sua atuação? Que tormento ou desrespeito causou o apostolado e seus membros para que a misericórdia, qualidade tão alardeada em tempos como este, fosse simplesmente suplantada? Qual foi o pecado do Instituto que fez o Arcebispo esquecer que sua missão também inclui “favorecer as várias formas de apostolado”[7]?

Tendo clareza de quem deve ser consultado, o Arcebispo menciona o Conselho Presbiteral e o Colégio de Consultores. Certamente correto em os ouvir, é incoerente, no entanto, uma vez que, “unido à Sua Santidade o Papa Francisco”, o Arcebispo deveria ter ciência de que, antes de dizimar um apostolado inteiro deveria, pelo menos, ouvir os leigos. Sobretudo incoerente, sabendo que o Papa quer ouvir a maior parte dos membros da Igreja para o Sínodo dos Bispos em 2023. Se não se consegue – ou não se quer – ouvir os fiéis leigos de uma humilde Capela como a do Instituto, como pretende o Arcebispo encaminhar ao Papa as opiniões dos fiéis da Arquidiocese sobre o futuro da Igreja? Provável que seja, como foi na decisão de exclusão do Instituto Bom Pastor, feito por cartilhas e reuniões privadas do Conselho Presbiteral ou pelos Movimentos de leigos adeptos ao clericalismo autoritário e paroquial que vilipendia e cerceia a voz dos fiéis, pais e mães de famílias que, como leigas ovelhas, buscam o redil de Nosso Senhor.

Estes Conselhos, estas reuniões nas paróquias e salas diocesanas, feitas em ditames preestabelecidos nada são que não exemplos claros do clericalismo ditatorial que assola a Igreja e deixa refém o povo de Deus. O Instituto Bom Pastor, ao contrário do que as palavras severas do Arcebispo fazem crer, jamais pregou no escuro: ao contrário, como luz de candeeiro que deve ficar sobre a mesa, os ensinamentos ortodoxos e fiéis, em consoante com a Tradição da Igreja, podem ser encontrados às claras e em público: nas redes sociais, em seus sites, enfim, basta perguntar. Cientes de que “o magistério não está acima da palavra de Deus, mas a serviço dela”[8], o Instituto pregou e prega abertamente os Sacramentos, a Verdade, a obediência, as virtudes. Tudo o que leva ao céu, tudo o que os Papas e os Santos sempre ensinaram.

Incrível ver tamanha disposição do Arcebispo em condenar o Apostolado do Instituto Bom Pastor quando, em território de sua jurisdição, acometidos de tantos escândalos morais e doutrinais por parte do clero diocesano e religioso, pouco se ouviu da voz do pastor para consolo dos pequeninos. Incrível e desconcertante a omissão em investigar as necessidades dos leigos que pertencem a este apostolado; desassistir famílias inteiras em sua fé e sua prática religiosa não faz coro à autoridade episcopal que o Arcebispo rememora.

Prosseguindo com sua carta, o Arcebispo, Dom Peruzzo, enfatiza que o Concílio Vaticano II precisa ser respeitado. Ele deve o respeitar, concordamos com ele e salientamos que, para ser mais preciso, que o nosso sim seja sim e o nosso não, não (São Mateus, 5, M7); portanto, se proclamamos a infalibilidade e obrigatoriedade conciliar, em consonância, não podemos escolher a que aderir ou não. Para tanto, questionamos Vossa Reverendíssima porque ocultou de sua decisão algumas elucidações tão importantes trazidas pelo Concílio, como a “conservação da devida liberdade tanto nas várias formas de vida espiritual e de disciplina, como na diversidade de rituais litúrgicos”[9]. Sobretudo, porque “todos os homens devem estar livres de coação, quer por parte dos indivíduos, quer dos grupos sociais ou qualquer autoridade humana; e de tal modo que em matéria religiosa ninguém seja forçado a agir contra a própria consciência, nem impedido, dentro dos devidos limites, de proceder segundo a mesma, e em particular, só ou associado com outros” [10].

É, portanto, “injustiça contra a pessoa humana e contra a própria ordem estabelecida por Deus, negar ao homem o livre exercício da religião na sociedade, uma vez salvaguardada a justa ordem pública”. Se o Concílio exorta a todos os homens que “ponderem com muita atenção a grande necessidade da liberdade religiosa, sobretudo nas atuais circunstâncias da família humana”[11] quanto mais o Concílio exorta aos bispos, que tem a “obrigação de dar exemplo”[12] e que devem “ouvir mais os leigos, para que estes tenham um lugar conveniente na vida da igreja”[13]. Sim, o Concílio precisa ser respeitado, Arcebispo.

Acreditamos que a Nova Evangelização, disseminada em todo o Brasil, e defendida pelo Arcebispo de Curitiba, não seja essa evangelização clericalista e insalubre tão criticada pelo Papa Francisco, ou aquela que ataca os homens em sua dignidade, cerceando seus direitos intrínsecos e inegociáveis, como o é a liberdade religiosa e nem a que coage o povo para que, não segundo os dizeres de um ou dois homens de cajado, sejam obrigados a se apartar da grei do Senhor.

Como uma árvore má não pode dar bons frutos, se a ação tempestuosa do Arcebispo visa o bem e a paz do povo de Deus e indica sua preocupação pastoral, poderia dizer, então, em espírito de transparência, os maus frutos do Apostolado do Instituto Bom Pastor? Seriam as famílias numerosas, tesouro da Igreja, conforme o Papa Pio XII? Seria a recusa aos métodos contraceptivos, conforme a Humanae Vitae – cujo uso (de contraceptivos) tem levado tantas almas ao inferno e para os quais nenhuma carta de censura fora escrita pelo Arcebispo – do Papa do Concílio, Paulo VI? Seria o silêncio, a piedade, a modéstia, a mortificação, exemplos vívidos e tangíveis pregados pelo Instituto Bom Pastor e seus membros e, inclusive, defendida e incentivada pelo Papa Francisco em suas Catequeses sobre a Santa Missa, de 2017, ou em sua Exortação Apostólica Gaudete et Exsultate?

Imploramos ao Arcebispo que vigie e que preserve os leigos fiéis que, pelo batismo, “são incorporados à Igreja de Cristo e que nela possui deveres e direitos próprios”[14]. Imploramos que o senhor Arcebispo encare o Instituto Bom Pastor como cristãos católicos autênticos, como de fato são, pois fazem parte da “reunião de todas as pessoas batizadas que, vivendo na Terra, professam a mesma fé e a mesma lei de Cristo, participam dos mesmos Sacramentos e obedecem aos legítimos pastores, principalmente ao Romano Pontífice”[15].

Pedimos respeitosa e calorosamente ao Arcebispo que considere todos os clamores levantados pelos fiéis leigos de Curitiba e de todo o Brasil em socorro ao Instituto, tendo em vista os indizíveis benefícios provenientes do sacerdócio exercido pelo padre Thiago Bonifácio: as confissões ouvidas antes da Missa e durante toda a semana, a Santa missa celebrada com extrema piedade, os conselhos e admoestações, seus sermões, enfim, todo o seu espírito paterno que tantas almas têm guiado pelo bom caminho.

Suplicamos ao senhor Arcebispo que considere os 13.118 [16] fiéis que assinaram o abaixo-assinado em apoio ao Instituto Bom Pastor de Curitiba, como fiéis sedentos de santidade e que a buscam livremente, por meio do Instituto e seus sacerdotes, em Comunhão com toda a Igreja, com a lei e com as bênçãos divinas, a santidade e o Paraíso.

 

Intercedei por nós junto ao Arcebispo, Santos todos de Deus.

Jesus Cristo, Bom Pastor!

Imaculada e Santa Virgem Maria!

Castíssimo São José, patrono da Igreja!

 

29 de dezembro de 2021.

Católico leigo,

Santa Catarina, Brasil.

 

Referências:

 

[1] Papa Bento XVI, Summorum Pontificum, 2007, cf. Art. 01.

[2] Dom José Antonio Peruzzo, Carta aos fiéis da Arquidiocese de Curitiba sobre a celebração da Santa Missa no Rito Extraordinário. Disponível em: http://arquidiocesedecuritiba.org.br/2021/12/27/dom-peruzzo-emite-carta-aos-fieis-sobre-celebracoes-no-rito-extraordinario/. Último acesso em dez. 2021.

[3] Papa João Paulo II, Decreto Christus Dominus, 1965.

[4] Ibid, cf. Art. 16.

[5] Ibid, cf. Art. 16.

[6] Papa Francisco, Traditionis Custodes, 2021.

[7] Papa João Paulo II, Decreto Christus Dominus, 1965, cf. Art. 17.

[8] Catecismo da Igreja Católica, cf. Art. 86.

[9] Concílio Vaticano II, Unitatis Redintegratio, cf. Art. 4.

[10] Concílio Vaticano II, Dignitatis Humanae, cf. Art. 02.

[11] Concílio Vaticano II, Christus Dominus, cf. Art. 15.

[12] Ibid, cf. Art. 01.

[13] Ibid, cf. Art. 10.

[14] Código de Direito Canônico, Cânon. N° 96.

[15] Catecismo Maior de São Pio X, cf. Art. 149.

[16] Até o momento da publicação desse texto, em 02 de janeiro de 2022.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.