3 de junho de 2013

Sermão 2º Domingo depois de Pentecostes - Padre Daniel Pinheiro - IBP


A Assistência à Santa Missa


Sermão para o Segundo Domingo depois de Pentecostes
02 de junho de 2013 - Padre Daniel Pinheiro

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave-Maria…
***
“Um homem fez uma grande ceia e convidou muitos. E, à hora da ceia, mandou um servo dizer aos convidados que viessem, porque tudo estava preparado.”
A Parábola que Nosso Senhor conta hoje nos faz ver a conduta misericordiosa de Deus, que convida todos os homens à prática do Evangelho, à fé, à Igreja, à salvação, à felicidade eterna do céu. Todavia, podemos ver também nesse banquete a Santa Missa. Não porque a Missa seja essencialmente um banquete, pois sabemos que ela é essencialmente a renovação do sacrifício do Calvário. Podemos, porém, dizer que a Santa Missa é esse banquete ao qual Nosso Senhor nos convida, que ela é esse banquete que já está todo preparado. Todavia, quantos, infelizmente, não compreendem o valor da Santa Missa e quantos fabricam desculpas para não assistir à Santa Missa.
O terceiro mandamento nos manda santificar os domingos e festas. A nossa razão, sem necessidade da revelação, nos mostra que temos o dever de dedicar uma parte do nosso tempo ao culto de Deus, e isso não só em privado, mas também em público, pois somos animais racionais e sociais. Devemos dedicar um tempo para honrar publicamente aquele que nos criou, que nos sustenta, etc. Para facilitar o cumprimento desse dever, Deus determinou ao povo eleito que o sábado deveria ser o dia do Senhor. Essa determinação foi abrogada pela Nova Lei, que substituiu o sábado pelo domingo, porque foi nesse dia que Nosso Senhor ressuscitou e porque foi no domingo de Pentecostes que a Igreja foi promulgada, como dissemos na Festa de Pentecostes. Mudou-se também o dia para que os cristãos não confundissem as festas da nova lei com as festas judaicas. Esse mandamento de santificar domingos e festas nos obriga, de um lado, a cultuar e Deus como ele quer ser cultuado: pela assistência à Santa Missa. Por outro lado, ele obriga ao descanso dominical, proibindo, em particular, os trabalhos servis.
Trataremos hoje da assistência à Santa Missa. O homem tem o dever de honrar e adorar publicamente a Deus. Isso se faz, antes de tudo, por meio do sacrifício, que é o ato oficial e externo de adoração que os indivíduos e a sociedade oferecem a Deus. Hoje, e até o final dos tempos, esse sacrifício é o Sacrifício de Cristo renovado em nossos altares. Hoje, esse sacrifício é a Santa Missa. Não há outro sacrifício que seja agradável a Deus. Não devemos sacrificar comidas, animais ou outras criaturas. Oferecer a Deus outro sacrifício, que não o sacrifício da Missa, é desagradar a Deus. Só um sacrifício é possível, o da Santa Missa.
Nos domingos e festas de preceitos, somos, então, obrigados a assistir à Missa sob pena de pecado mortal. Muitas pessoas já não compreendem porque o fato de deixar de assistir à Missa aos domingos e dias santos sem ter motivo sério é uma falta grave e acham isso um exagero. Infelizmente, muitos já não sabem ou não querem compreender que a Santa Missa é o maior bem que nós temos na terra. Na Santa Missa, é o sacrifício de Cristo que se renova. A Missa e o a Cruz são o mesmo sacrifício. O mesmo sacerdote, que é Cristo. A Mesma vítima, que é também Cristo. A única diferença entre a Missa e o Calvário é o modo pelo qual Nosso Senhor Jesus Cristo se oferece a Deus. Na Cruz, Cristo se ofereceu de modo cruento, com sofrimentos, com derramamento de sangue. Na Missa, Ele renova o sacrifício do Calvário, oferecendo-se a si mesmo de forma incruenta, de forma sacramental, sem sofrimento, sem sangue, sem morrer novamente. É pela Cruz que Cristo nos obteve a possibilidade de ter os pecados perdoados. É pela Cruz que Cristo nos obteve os méritos para pedirmos as graças necessárias para a nossa salvação. É pela Cruz que Cristo no torna possível adorar perfeitamente a Deus. É pela Cruz que podemos agradecer a Deus por todos os benefícios que nos deu. Tudo isso que Cristo adquiriu no Calvário, Ele quis nos dar e aplicar por meio da Santa Missa, por meio da renovação incruenta de seu sacrifício. Podemos dizer, então, que é pela Missa que podemos obter o arrependimento de nossos pecados para buscar a confissão. É pela Missa que podemos obter as graças que precisamos para nos salvar. É pela Missa que podemos agradecer a Deus pelos seus inúmeros benefícios. É pela Missa que podemos adorar a Deus perfeitamente, reconhecendo o soberano domínio de Deus sobre todas as coisas e nos submetendo a esse soberano domínio. Claro que podemos fazer tudo isso fora da Missa, e devemos fazer todas essas coisas fora da Missa. Toda a eficácia, porém, dessas ações vêm da Missa, da Santa Missa. A Missa é o centro do mundo. A Missa é o centro de nossas vidas. Todas as graças vêm ao mundo por meio de Cristo, todas as graças nos são aplicadas por Cristo por intermédio da Santa Missa (daí, diga-se de passagem, a importância do Rito da Missa e a importância da Missa ser bem celebrada). A Santa Missa tem um valor infinito, pois nela é o próprio Homem-Deus que se oferece à Santíssima Trindade.
Tendo compreendido isso, é fácil compreender porque somos obrigados, pelo terceiro mandamento do decálogo e pelo primeiro mandamento da Igreja a assistir à Missa aos domingos e festas sob pena de pecado mortal. Pela Missa nos vem todas as graças como acabamos de dizer. Deixar de assistir à Missa aos Domingos sem ter uma razão séria, sem ter uma razão proporcional, traz para nossas almas grandes prejuízos. Deixamos de honrar Deus como lhe é devido. Deixamos de agradecer-lhe como lhe é devido. Deixamos de obter graças abundantíssimas para a nossa salvação. Deixamos de obter graças imensas de verdadeiro arrependimento. Trocamos um tesouro de valor infinito por uma criatura, pela preguiça, por uma diversão ou outra coisa…
Todos os fiéis devem, então, assistir à Missa aos domingos e dias de preceito determinados pela Igreja, sob pena de pecado mortal. E devemos assistir à Missa inteira, do primeiro sinal da cruz à bênção final. Para assistir à Missa, devemos ter a presença corporal, a intenção de cultuar a Deus e a atenção.
É preciso, então, assistir à Missa inteira. Quem falta a alguma parte dela já não assiste à Missa inteira. Conforme ao que se deixa de assistir, comete-se um pecado grave ou leve. Deixar de assistir a uma parte notável da Missa, pela duração ou pela importância, é falta grave. Assim, alguém que chega depois do ofertório, ou que chega depois do Evangelho e sai logo depois da comunhão omite uma parte notável da Missa. Aquele que se ausenta do prefácio até a consagração incluída ou da consagração inclusa até o Pai Nosso também perde uma parte notável, ainda que assista a todo o resto. Aquele que assiste à Missa inteira, mas deixa de assistir à consagração, também deixa de assistir a uma parte notável da Missa e comete uma falta grave. O Preceito pode ser cumprido, em caso de necessidade, pela assistência a duas Missa distintas, desde que não sejam celebradas ao mesmo tempo (no Rito tradicional é possível ter várias Missas em uma Igreja ao mesmo tempo, em altares distintos)  e desde que se assista à consagração e à comunhão do sacerdote na mesma Missa.
Se a pessoa perde uma parte não notável da Missa, comete uma falta venial. Por exemplo, chegar atrasado, mas antes do ofertório não é perder uma parte notável. Deixar de assistir somente ao que segue à comunhão do sacerdote também não é perder uma parte notável. Deixar de assistir do início até a Epístola junto com o que segue à comunhão, também não é omitir uma parte notável. Diga-se, de passagem, que aquele que perde uma parte não notável da Missa pode comungar, pois não cometeu um pecado mortal ao deixar de assistir a uma parte não notável da Missa.
Em todo caso, o que chega atrasado à Missa está obrigado, leve ou gravemente, conforme à importância do que deixou de assistir, a suprir a parte que Missa que perdeu, assistindo-a em outra Missa, a não ser, claro que seja moralmente ou fisicamente impossível, por tratar-se da última Missa, por exemplo ou por outras razões válidas.
É evidente que para julgar a gravidade do pecado cometido é preciso considerar não só a qualidade ou a quantidade das partes da Missa a que se deixou de assistir, mas também a negligência e culpa da pessoa em não chegar no horário ou em não suprir a parte perdida da Missa. Se a pessoa não chegou antes do ofertório porque há um engarrafamento inesperado, por exemplo, não há, claro, nenhuma falta.
Essa presença corporal necessária para assistir à Missa é uma presença moral, de tal forma que seja possível dizer que aquela pessoa é uma das que realmente assistem à Missa. Por falta de presença corporal não cumpre o preceito aquele que assiste à Missa pela televisão ou pelo rádio ou o que permanece tão afastado do grupo de pessoas que assistem à Missa que já não se pode considerar que ela faz parte desse grupo. Todavia, não é necessário estar dentro da Igreja nem ver o sacerdote, bastando que faça parte dos que assistem à Missa e que possam acompanhar a Missa de alguma forma, seja pelos sons do sinos ou dos cantos, seja pelos gestos das outras pessoas, ajoelhando, levantando, etc…. Portanto, aqueles que estão na sacristia, ou atrás de uma coluna ou até mesmo na rua, se a Igreja está cheia, ou que estão ali atrás no claustro, estão corporalmente presentes à Missa e cumprem perfeitamente o preceito.
Além da presença corporal, é necessário que se assista à Missa com a devida intenção de cultuar Deus. Assim, aquele que vai à Missa unicamente para ouvir a música ou simplesmente para acompanhar outra pessoa, sem a intenção de honrar Deus, não assiste à Missa.
É preciso também ouvir a Missa com atenção, quer dizer, com a aplicação de nosso espírito ao que está ocorrendo. Para ouvir validamente a Missa se requer, ao menos, a atenção externa, evitando toda ação incompatível com a aplicação de nosso espírito à Missa. Assim, aquele que lê livros não religiosos durante parte notável da Missa não cumpre o preceito; aquele que conversa ou dorme durante parte notável da Missa não cumpre o preceito, etc. Por outro lado, o que toca órgão, o que faz a coleta, o que canta no coral ou o que dorme por alguns momentos, cumpre o preceito. A presença corporal com a intenção de honrar Deus e a atenção externa bastam para cumprir validamente o preceito. Claro que estamos falando aqui do mínimo para que o preceito seja cumprido e não do ideal, pois para que a pessoa possa obter os frutos da Missa e para que haja realmente o culto a Deus por parte dela, é preciso também a atenção interior, aplicando nossa inteligência e nossa vontade ao que está se realizando sobre o altar. Essa atenção pode ser às palavras e gestos do sacerdote, à significação dessas palavras e gestos, ou fazendo atos de caridade ou recitando orações piedosas, como o Terço. A distração voluntária durante a Missa é, portanto, uma falta, em geral leve, mas é uma falta, e uma falta que nos priva de muitas graças.
Muitas pessoas têm dúvidas com relação à assistência à Missa e o cuidado com as crianças pequenas. Como Nosso Senhor disse: deixai vir a mim as criancinhas (Lucas XVIII, 16). Claro que aquele que tem que voltar sua atenção aos cuidados da criança cumpre o preceito perfeitamente, bem como não tem que se preocupar aquele que tem que se afastar um pouco mais do grupo das pessoas que assistem à Missa quando a criança faz um pouco mais de barulho. Muitos pais gostariam de poder prestar mais atenção à Missa, mas a santidade não consiste em fazer o que queremos, mas em fazer aquilo que Deus quer, em particular cumprindo com nossos deveres de estado. Ofereça à Santíssima Trindade os cuidados que são dispensados aos filhos e que impedem o prestar atenção perfeitamente na Missa. É boa, muito boa a presença das crianças na Missa, pois na Missa rezamos de modo particular por todos os presentes. A criança, ainda que não compreenda o que está ocorrendo, recebe muitas graças em virtude dessas orações. Além disso, muitas graças são dadas à família que assiste à Missa unida. Aquele que vem à Missa com as crianças assiste à Missa e assiste bem à Missa, ainda que dedique parte notável da Missa aos cuidados da criança. Os pais podem e devem – com discrição, voz baixa e sem atrapalhar os outros – explicar às crianças o que está ocorrendo durante a Missa em suas partes mais importantes, sem que a assistência à Missa seja prejudicada. Tudo isso demanda um certo sacrifício dos pais, mas esse sacrifício será recompensado pelas graças recebidas pelas crianças e pelos pais. E, muito rapidamente, as crianças se acostumarão a ficar quietas durante a Missa.
Consideramos brevemente, então, o valor infinito da Missa e que, por isso, somos obrigados a assistir à Missa aos domingos e dias de preceito. E vimos que devemos assistir à Missa com presença corporal, com intenção de cultuar Deus e com atenção ao menos externa. Para deixar de assistir à Missa é necessária uma causa medianamente grave, ou seja, é preciso algo que cause um notável incômodo ou notável prejuízo nos bens da alma ou do corpo da própria pessoa ou do próximo. Para julgar a gravidade da causa devemos examinar se ela nos impediria também de fazer outras coisas importantes. As principais causas para poder deixar de assistir à Missa licitamente são três. A primeira é a impossibilidade moral: por exemplo, uma doença que impeça sair de casa também para outros assuntos importantes; uma distância considerável – os moralistas dizem cerca de uma hora a pé e tem gente que não quer fazer meia hora, quarenta minutos de carro;  também os muito anciãos ou debilitados, que não podem ir à Igreja ou permanecer todo o tempo da Missa sem grave incômodo etc. não têm obrigação. Outro motivo que dispensa de assistir à Missa é a caridade, que obriga a socorrer o próximo, por exemplo, acompanhando um doente, ou se puder impedir com sua presença um pecado grave, ou para combater um incêndio e assim por diante… O terceiro principal motivo é por ter de cumprir uma obrigação, ou um dever: às vezes as mães para cuidar dos filhos, os militares, os policiais que devem garantir a segurança, médicos que têm de ficar de plantão e outros…
O católico que deixa de ir à Missa deixa de receber inúmeras graças, prejudica muitíssimo a sua vida espiritual e ofende gravemente a Deus, que quer ser honrado come lhe é devido, pela participação dos fieis à Santa Missa, pela participação à renovação do Sacrifício de Cristo. Assistir à Missa não é um fardo insuportável, mas é um grande bem para nossas almas e para a sociedade. A Missa é o que há de mais importante na terra, é o nosso maior tesouro, pois é em virtude dela, em última instância, que nos santificamos.  Nosso Senhor já preparou tudo e nos convida com insistência a assistir à Missa e a assistir bem à Santa Missa. Basta aceitarmos o convite, sem desculpas vãs como as dos convidados para o banquete.
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

NOVENA DO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS - SEXTO DIA.

SEXTO DIA - SEGUNDA-FEIRA
Coração misericordioso de Jesus.

Misericordia eius a progenie in progenies timentibus eum – “A sua misericórdia se estende de geração a geração, sobre os que o temem” (Luc. 1, 50).

Sumário. Onde poderemos encontrar um coração mais terno que o Coração de Jesus, um coração que se compadeça mais de nossas misérias? É movido por esta misericórdia que baixou do céu à terra para nos buscar, suas ovelhas desgarradas; agora ainda sempre nos convida a que voltemos a ele, e promete que se esquecerá de todas as injúrias recebidas. Não tardemos, pois, a nos lançar nos braços de tão amoroso Pai; peçamos-Lhe perdão das ingratidões passadas e façamos o protesto que nunca jamais d'Ele nos afastaremos.

I. Onde poderíamos achar um coração mais terno e misericordioso do que o Coração de Jesus, um coração que se tenha compadecido mais das nossas misérias? A sua misericórdia fê-lo baixar do céu à terra; fê-lo dizer que era Ele o bom Pastor vindo a dar a vida pelas suas ovelhas. Para nos obter o perdão, a nós, pecadores, não perdoou a si mesmo e quis sacrificar-se sobre a cruz, afim de sofrer Ele mesmo o castigo que nós tínhamos merecido.

É a mesma piedade e compaixão que O faz ainda agora dizer: Quare moriemini, domus Israel? Revertimini et vivite (1) – “Porque morrereis, ó casa de Israel? Voltai e vivei”. Ó homens, parece dizer, meus pobres filhos, porque vos quereis condenar, fugindo de mim? Não vedes que afastando-vos de mim correis para a morte eterna? Não vos quero ver condenados; não desanimeis, se quereis voltar a mim, voltai e recuperareis a vida: Revertimini et vivite. – A mesma misericórdia O faz ainda dizer que ele é o Pai amoroso que, posto que desprezado pelo filho, não sabe repulsá-lo quando volta arrependido, mas o abraça com ternura e se esquece de todas as injúrias recebidas: Peccatorum tuorum non recordabor (2) – “Não me lembrarei de teus pecados”.

Não é assim que soem fazer os homens. Estes, ainda que perdoem, guardam sempre a lembrança da ofensa recebida e sentem desejos de vingança; e se não se vingam, porque são tementes de Deus, ao menos têm grande repugnância de conversar e tratar com aqueles que os ofenderam. – ah, meu Jesus, Vós perdoais aos pecadores arrependidos e não recusais dar-Vos a eles todo inteiro nesta terra pela santa comunhão e no céu pela luz da glória, sem que mostreis a menor repugnância em conservar unida convosco, por toda a eternidade, à alma que Vos ofendeu. Onde então achar um coração tão amável e misericordioso como o vosso, ó meu amado Salvador?

II. Ó Coração misericordioso de meu Jesus, tende compaixão de mim. Meu dulcíssimo Jesus, tende compaixão de mim. Eu Vo-lo digo agora e dai-me, ó Jesus, a graça de sempre Vos repetir esta súplica: Ó meu dulcíssimo Jesus, tende compaixão de mim. Antes de Vos ofender, ó meu Redentor, não merecia, por certo, nenhuma das muitas graças que me fizestes. Vós me criastes, me comunicastes tantas luzes, sem merecimento da minha parte. Depois, porém, que pequei, não somente não sou digno de favores, mas mereço ser abandonado de Vós e precipitado no inferno. A vossa misericórdia é que Vos fez esperar-me e conservar-me a vida quando me achava na vossa desgraça. A vossa misericórdia é que me esclareceu e me convidou à penitência; ela me deu a dor dos pecados e o desejo de Vos amar
 e pela vossa misericórdia nutro a confiança de estar em vossa graça.

Ó meu Jesus, não cesseis de exercer misericórdia comigo. “Para Vos mostrar a minha gratidão e para reparar as minhas infidelidades, Vos dou o meu coração e me consagro inteiramente a Vós, ó meu amável Jesus e com vosso auxílio proponho nunca mais pecar.” (3) – É esta a misericórdia que Vos peço; iluminai-me e fortalecei-me para não ser mais ingrato para convosco.

Meu amor, não pretendo que torneis a perdoar-me se eu tornar a virar-Vos as costas; isto seria um presunção que havia de impedir que usásseis de misericórdia para comigo. Que misericórdia poderia esperar ainda de Vós, se viesse novamente a desprezar a vossa amizade, separando-me de Vós? Ó meu Jesus, amo-Vos e quero sempre amar-Vos. É esta a misericórdia que Vos imploro e espero: Não permitais, não permitais que me separe de Vós. – Ó minha Mãe, Maria, rogo-vos também: não permitais que ainda me separe de meu Deus.

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1. Ez. 18, 31 et 32.
2. Is. 43, 25.
3. Indulg. de 100 dias, quando se reza diante da imagem do Sagrado Coração.

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo Segundo: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 162-165.)

2 de junho de 2013

NOVENA DO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS - QUINTO DIA.

SEGUNDO DOMINGO DEPOIS DE PENTECOSTES
Coração aflito de Jesus.

TristIs est anima mea usque ad mortem – "Minha alma está triste até a morte" (Marc. 14, 34).

Sumário. A dor mais cruciante que afligiu o Coração de Jesus no correr de toda a sua vida, não foi a previsão dos tormentos e ultrajes que o esperavam, mas sim a previsão da ingratidão dos homens e dos ultrajes que lhe haviam de fazer no Sacramento de seu amor, na Santíssima Eucaristia. Ó Deus! Se nós temos cometido pecados, temos igualmente cooperado para afligir o Coração amabilíssimo de Jesus. Peçamos-Lhe ao menos perdão e tomemos a resolução de O amarmos com tanto mais ardor para o futuro.

I. É impossível considerar a grandeza da aflição do Coração de Jesus nesta terra pelo amor dos homens e não nos compadecermos dele. Jesus Cristo mesmo nos faz saber que seu Coração chegou a tal auge de tristeza, que esta só fora suficiente para lhe tirar a vida e fazê-Lo morrer de pura dor, se o poder divino não tivesse por um milagre impedido a morte. Tristis est anima mea usque ad mortem – "Minha alma está triste até a morte".

A dor mais cruciante que tanto afligiu o Coração de Jesus, não foi a previsão dos tormentos e opróbrios que os homens Lhe preparavam, mas sim a previsão da ingratidão deles para com o seu amor imenso. Jesus previu distintamente todos os pecados que nós havíamos de cometer, depois de tantos sofrimentos seus e de uma morte tão amargosa e ignominiosa. Previu em particular as injúrias horrorosas que os homens haviam de infligir a seu adorável Coração, que lhes queria deixar no Santíssimo Sacramento, como penhor de afeto.

Ó Deus! Que ultrajes não recebeu Jesus dos homens neste Sacramento de amor! Uns calcaram-no aos pés, outros atiraram-no aos esgotos, outros dele se serviram para fazerem obséquio ao demônio! Todavia, a previsão de todos esses desprezos não obstou a que nos deixasse tão Grande penhor do seu amor. Jesus odeia em extremo o pecado, mas parece que o amor para conosco ainda ultrapassa o ódio que tem ao pecado; porquanto prefere permitir tantos sacrilégios a privar as almas andantes deste alimento celeste.

Não será tudo isso bastante para nos mover a amar um Coração que tanto nos amou? Não terá, por ventura, Jesus Cristo feito bastante para merecer o nosso amor? Deixaremos, ingratos, Jesus Cristo abandonado sobre o altar como fazem a maior parte dos homens? E não nos uniremos antes àquelas poucas almas devotas que sabem ser reconhecidas, para nos consumir de amor mais do que se consomem as velas que ardem ao redor dos santos tabernáculos? O Coração de Jesus ali está ardendo de amor para conosco; e, na sua presença, nós não arderemos de amor para com Ele?

II. Ó meu adorável e amado Jesus, eis aqui a vossos pés aquele que tanto contristou vosso amabilíssimo Coração. Ó céu! Como pude amargurar tanto esse Coração que tamanho amor me tem e não poupou nada para se fazer amar de mim! Mas, consolai-Vos, ó meu Salvador, assim Vos direi, consolai-Vos e sabei que meu coração, ferido pela graça do vosso santo amor, experimenta agora vivo pesar dos desgostos que Vos deu, e quisera morrer de dor. Quem me dera, ó meu Jesus, ter uma dor dos meus pecados igual à que Vós tivestes durante a vossa vida!

A Vós, Eterno Pai, ofereço a pena e o horror que vosso divino Filho sentiu de minhas faltas, e Vos peço, pelos seus merecimentos, que me deis tal arrependimento dos meus pecados, que viva d'aqui em diante em estado de dor continua, pensando no desprezo que outrora fiz à vossa amizade. E Vós, ó meu Jesus, dai-me no futuro tão grande horror do pecado, que me faça detestar ainda as faltas mais leves, por desagradarem a Vós, que sois digno de nunca ser ofendido, nem leve nem gravemente; sois digno de um amor infinito.

Ó meu amado Senhor, detesto tudo que Vos desagrada e no futuro só a Vós quero amar e aquilo que Vós amais Ajudai-me e fortalecei-me; dai-me a graça de Vos invocar sempre e de repetir sem cessar: Meu Jesus, dai-me o vosso amor, dai-me o vosso amor. Doce Coração de meu Jesus, fazei que eu vos ame mais e mais. E vós, Maria Santíssima, obtende-me a graça de nunca deixar de vos dizer: Minha Mãe, fazei que eu ame a Jesus Cristo. (II 416.)

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 160-162.)

1 de junho de 2013

NOVENA DO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS - QUARTO DIA.

QUARTO DIA – SÁBADO
Coração de Jesus, suspirando por ser amado.

Ecce, sto ad ostium et pulso: si quis... aperuerit mihi ianuam, intrabo ad illum – “Eis que estou à porta e bato; se alguém... me abrir a porta, entrarei em sua casa” (Apoc. 3, 20).

Sumário. Jesus não precisa de nós; com ou sem o nosso amor é Ele igualmente feliz, rico e poderoso. Mas, porque nos ama, acha as suas delícias em conversar com os filhos dos homens e deseja tanto ser de nós amado, como se o homem lhe fosse Deus e a sua felicidade dependesse da do homem. Que monstruosa seria, pois, a nossa ingratidão, se não procurássemos satisfazer os desejos desse Coração amabilíssimo! Que contas teríamos de lhe dar um dia no tribunal divino!

I. Jesus não precisa de nós; com ou sem o nosso amor é Ele igualmente feliz, rico e poderoso. Todavia, diz Santo Tomás, porque Jesus Cristo nos ama, Ele deseja tanto o nosso amor, como se o homem lhe fosse Deus e a sua felicidade dependesse da do homem. É o que pasmava ao santo Jó que dizia: Quid est homo, quia magnificas eum: aut quid apponis erga eum cor tuum? (1) – “Que é o homem para o engrandeceres? E porque pões sobre ele o teu coração?” Como? Um Deus desejar e pedir com tamanha instância o amor de um verme!

Já seria grande favor, se Deus nos tivesse permitido amá-Lo. Se um vassalo dissesse a seu monarca: Senhor, eu vos amo; seria tido por um sujeito presunçoso. Mas que se havia de dizer, se o rei ordenasse ao vassalo: eu quero que me ames: não se abaixam a tanto os reis da terra; mas Jesus Cristo, o Rei do céu, Ele nos pede com todo o empenho o nosso amor: Diliges Dominum Deum tuum ex toto corde tuo (2) – “Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração”. Com toda a insistência nos pede o coração: Praebe, fili mi, cor tuum mihi (3) – “Meu filho, dá-me teu coração”. – Mesmo quando se vê expulso de uma alma, Jesus não se afasta, fica à porta do coração, chama e bate para entrar: Sto ad ostium et pulso – “Estou à porta e bato”: roga à alma que lhe abra, chamando-a sua irmã e esposa: Aperi mihi, soror mea, sponsa (4) – “Abre-me, minha irmã e esposa”. Numa palavra, Jesus acha as suas delícias em ser amado de nós e fica todo consolado quando uma alma lhe diz e freqüentemente repete: Jesus, meu Deus, eu Vos amo sobre todas as coisas.

Tudo isso é efeito do grande amor que Jesus nos tem. Quem ama, deseja necessariamente ser amado. O coração pede o coração; amor busca amor. Ad quid diligit Deus, nisi ut ametur? - “Para que é que Deus ama, senão para ser amado?” pergunta São Bernardo; e antes dele o próprio Deus dissera: “Ó Israel, que é que o Senhor teu Deus pede de ti, senão que o temas, andes nos seus caminhos e O ames e sirvas de todo o teu coração e de toda a tua alma?” (5)

II. Porque Jesus Cristo deseja que o amemos de todas as nossas forças, nos diz que Ele é o Pastor, que, tendo achado a ovelha perdida, convida todos a congratularem-se com Ele: Congratulamini mihi, quia inveni ovem meam quae perierat (6). Assegura-nos que é aquele pai que, quando o filho pródigo se prostra a seus pés, não somente lhe perdoa, mas o abraça com ternura (7). Diz-nos que, quem não o ama, fica entregue à morte: Qui non diligit, manet in morte (8). Ao contrário, estreita a si ao que O ama e toma posse dele: Qui manet in caritate, in Deo manet, et Deus in eo (9) – “Aquele que permanece na caridade, permanece em Deus e Deus nele”. E tantos pedidos, tantas instâncias, tantas ameaças e promessas, não nos moverão a amar um Deus que tamanho desejo tem de ser amado por nós?

Meu amado Redentor, assim Vos direi com Santo Agostinho, Vós me ordenais que Vos ame, e se Vos não queira amar, me ameaçais o inferno; mas que inferno me poderia ser mais horrível, que desgraça mais triste do que ver-me privado do vosso amor? Se, pois, quereis, aterrar-me, ameaçai-me que terei de viver sem Vos amar: só esta ameaça me inspira mais medo que mil infernos. Meu Deus, se, no meio das chamas do inferno, os réprobos ainda Vos pudessem mais amar, o inferno se lhes transformaria em paraíso; e se, ao contrário, os Bem-aventurados do céu não Vos pudessem mais amar, o paraíso lhes seria um inferno.

Reconheço, ó meu amado Senhor, que pelos meus pecadores mereceria ser abandonado pela vossa graça, e portanto condenado a não poder mais amar-Vos; mas ouço que ainda me ordenais que Vos ame, e sinto em mim um grande desejo de Vos amar. Este desejo já é um dom de vossa graça; Vós mesmo m´o inspirais; dai-me, portanto, a força para o realizar. Fazei que doravante eu Vos diga com todas as veras e de todo o coração, e o diga sempre: Amo-Vos, meu Deus, amo-Vos, amo-Vos – Vós desejais meu amor, eu desejo o vosso. Esquecei-Vos, ó meu Jesus, dos desgostos que no passado Vos causei; amemo-nos sempre; eu Vos não deixarei e Vós tampouco me deixareis. Vós me amareis sempre e eu sempre Vos amarei. Meu querido Salvador, vossos méritos são a minha esperança. Por piedade, fazei que sempre e muito Vos ame e Vos ame um pecador que muito Vos ofendeu. – Virgem imaculada, Maria, socorrei-me, rogai a Jesus por mim. (II 415.)

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1 Iob. 7, 17.
2 Matth. 22, 37.
3 Prov. 23, 26.
4 Cant. 5, 2.
5 Deut. 10, 12.
6 Luc. 15, 6.
7 Luc. 15, 20.
8 I Io. 3,14.
9 I Io. 4, 16.

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo Segundo: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 157-160.)

HINOS EUCARÍSTICOS - LAUDA SION

LAUDA SION
Santo Tomás de Aquino
(Seqüência de Corpus Christi)




"Lauda, Sion, Salvatorem, lauda ducem et pastorem in hymnis et canticis.
Quantum potes, tantum aude: quia major omni laude, nec laudare sufficis.
Laudis thema specialis, panis vivus et vitalis hodie proponitur.
Quem in sacrae mensa coenae turbae fratrum duodenae datum non ambigitur.
Sit laus plena, sit sonora, sit jucunda, sit decora mentis jubilatio.
Dies enim solemnis agitur, in qua mensae prima recolitur hujus institutio.
In hac mensa novi Regis, novum pascha novae legis, Phase vetus terminat.
Vetustatem novitas, umbram fugat veritas, noctem lux eliminat.
Quod ln coena Christus gessit, faciendum hoc expressit in sui memoriam.
Docti sacris institutis, panem, vinum in salutis consecramus hostiam.
Dogma datur christianis, quod in camem transit panis et vinum in sanguinem.
Quod non capis, quod non vides, animosa firmat fides, praeter rerum ordinem.
Sub diversis speciebus, signis tantum et non rebus, latent res eximiae.
Caro cibus, sanguis potus: manet tamen Christus totus sub utraque specie.
A sumente non concisus, non confractus, non divisus: integer accipitur.
Sumit unus, sumunt mille: quantum isti, tantum ille: nec sumptus consumitur.
Sumunt boni, sumunt mali: sorte tamen inaequali, vitae vel interitus.
Mors est malis, vita bonis: vide paris sumptionis quam sit dispar exitus.
Fracto demum Sacramento, ne vacilles, sed memento, tantum esse sub fragmento, quantum toto tegitur.
Nulla rei fit scissura: signi tantum fit fractura, qua nec status nec statura signati minuitur.
Ecce panis Angelorum, factus cibus viatorum: vere panis filiorum, non mittendus canibus.
In figuris praesignatur, cum Isaac immolatur: agnus Deis Paschae deputatur: datur manna patribus.
Bone pastor, panis vere, Jesus, nostri miserere: Tu nos pasce, nos tuere: tu nos bona fac videre in terra viventium.
Tu, qui cuncta scis et vales: qui nos pascis hic mortales: tuos ibi commensales, cohaeredes et sodales fac sactorum civium. Amen. Alleluia".

"Louva, Sião, o Salvador, louva o guia e o pastor com hinos e cantares.
Quanto possas, tanto o louva, porque está acima de todo o louvor e nunca o louvarás condignamente.
É-nos hoje proposto um tema especial de louvor: o pão vivo que dá a vida.
O pão que na mesa da sagrada ceia foi distribuído aos doze, como na verdade o cremos.
Ressoem, pois, os louvores, sonoros, cheios de amor. Seja formosa e jovial a alegria das almas.
Porque celebramos o dia solene que nos recorda a instituição deste banquete.
Na mesa do novo rei, a páscoa da Nova Lei põe fim à páscoa antiga.
O rito novo rejeita o velho, a realidade dissipa as sombras como o dia dissipa a noite.
O que o Senhor faz na ceia mandou-no-lo fazer em memória Sua.
E nós, instruídos pelo mandato divino, consagramos o pão e o vinho em hóstia de salvação.
É dogma de fé para os cristãos que o pão se converte na carne e o vinho no sangue do Salvador.
O que não compreendes nem vês, diz-to a fé viva; porque isto se opera fora das leis naturais.
Debaixo de espécies diferentes, que são apenas sinais exteriores, ocultam-se realidades sublimes.
O pão é a carne e o vinho é o sangue; todavia debaixo de cada uma das espécies Cristo está totalmente.
E quem o recebe não o parte nem divide, mas recebe-o todo inteiro.
Quer o recebam mil, que um só, todos recebem o mesmo, nem recebendo-o podem consumi-lo.
Recebem-no os bons e os maus igualmente, porém com efeitos diversos: os bons para vida e os maus para a morte.
Morte para os maus e vida para os bons! Oh! Consideremos como são diferentes os efeitos que produz o mesmo alimento.
Não vacile a tua fé quando a hóstia é dividida; porque o Senhor encontra-se sempre todo, debaixo do pequenino fragmento ou da hóstia inteira.
Nenhum corte pode violar a substância: apenas os sinais do pão, que vês com os olhos da carne, foram divididos sem a menor alteração da realidade divina que esses mesmos sinais significam.
Eis pois que o pão de que se alimentam os Anjos foi dado em viático aos homens: pão verdadeiramente dos filhos, que não deve dar-se aos cães.
Foi já prefigurado nos ritos e nos acontecimentos do Testamento Antigo, na imolação de Isaac, no cordeiro pascal e no maná do deserto.
Ó bom Pastor e alimento verdadeiro dos que apascentas, ó Jesus, tende piedade de nós. Alimentai-nos e defendei-nos e fazei que mereçamos fruir da vossa glória na Terra dos vivos.
Vós que tudo conheceis e tudo podeis fazer, e nos alimentais aqui, na Terra, da mortalidade, admiti-nos, Senhor, lá no Céu, à vossa mesa e dai-nos parte na herança e na companhia dos que moram na cidade santa. Amém. Aleluia".

Tesouro de Exemplos - Parte 318

DUAS CLASSES DE PESSOAS

Um pároco convidou um seu paroquiano a fazer a páscoa.
- Mas, senhor vigário, para que confessar-me se eu não tenho pecado?
Respondeu-lhe o padre: - Olhe, senhor; só há duas classes de pessoas que não têm pecados: os que ainda não chegaram ao uso da razão e os que já a perderam.

Tesouro de Exemplos - Parte 317

OCULTARA OS PECADOS

Em Lima, capital do Peru, uma senhora tinha três criadas. Uma era cristã, convertida do paganismo. Deixou, porém, a prática da oração, tornou-se leviana e livre nos costumes. Tendo adoecido, recebeu os sacramentos com pouca devoção. Revelou, depois, às suas companheiras de serviço, que tivera o cuidado de ocultar ao sacerdote todos os pecados que cometera. Alarmadas, as companheiras levaram o fato ao conhecimento de sua patroa, a qual alcançou da enfêrma a promessa de fazer uma confissão sincera. Marta, assim se chamava ela, confessa-se de novo e morre depois de algum tempo. Apenas exalou o último suspiro, começou o seu cadáver a espalhar um mau cheiro insuportável, e tiveram de levá-lo para fora da casa. O cão, por natureza tranquilo, pôs-se a uivar lúgubremente. Uma das criadas, indo dormir no quarto onde Marta falecera, foi despertada por rumores espantosos; todos os móveis eram como que agitados por uma fôrça invisível e atirados ao solo. Com a outra criada deu-se a mesma cena espantosa. Resolveram, pois, passar juntas a noite. Ouviram, a certa altura, a voz clara e distinta de Marta, que se lhes apresentou em estado horrível e rodeada de chamas. Disse-lhes que, por ordem de Deus, vinha fazer-lhes conhecer em que estado se achava e que fôra condenada por seus pecados de impureza e por suas confissões mal feitas. E acrescentou: "Contai a outros o que acabo de revelar-vos, para que não sejam vítimas da mesma desgraça". A estas palavras lançou um grito de desespêro e desapareceu (Villard, v. III).

Sermão Festa de Corpus Christi- Padre Daniel Pinheiro - IBP


[Sermão] Eucaristia: o Santíssimo Sacramento do Altar


Sermão para a Festa de Corpus Christi
30 de maio de 2013 - Padre Daniel Pinheiro
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave-Maria…
***
A minha carne é verdadeiramente alimento e o meu sangue é verdadeiramente bebida. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue fica em Mim e Eu nele.
A Festa de Corpus Christi, prezados católicos, deve ser muito cara aos nossos corações. O que há de mais belo, de mais sublime, de mais divino do que a Santíssima Eucaristia? Nosso Senhor prometeu aos Apóstolos que estaria com eles todos os dias, até à consumação dos séculos. Nosso Senhor poderia ter se contentado em cumprir a sua promessa por sua presença espiritual, pelos auxílios da graça derivados de seus méritos infinitos obtidos, de modo particular, na cruz. Nosso Salvador quis, porém, permanecer entre nós em Corpo, Sangue, Alma e Divindade, sob as aparências do pão e do vinho. Após seu sacrifício na Cruz, não poderia haver modo mais eficaz, mais sublime de Nosso Senhor mostrar a sua caridade para conosco. A Eucaristia é o fruto do Sagrado Coração de Jesus que transborda de caridade para conosco.
Para que nós pudéssemos considerar em toda a sua plenitude essa caridade, foi instituída a festa de Corpus Christi. Na Quinta-Feira Santa, nós comemoramos e relembramos a instituição da Eucaristia, da Missa, do sacerdócio, mas nossa alma está muito ocupada com o pensamento da paixão e morte de Nosso Senhor. A Igreja quis, então, no séc. XIII, acrescentar um segundo dia em que festejamos e consideramos o triunfo de Nosso Senhor Jesus Cristo presente em Corpo, Sangue, Alma e Divindade. Um segundo dia em que festejamos o triunfo da caridade de Nosso Senhor para conosco.
A Eucaristia é um Mistério de nossa Santa Religião e é um dogma, quer dizer, uma verdade em que somos obrigados a acreditar com toda certeza, pois Deus nos revelou e a Igreja nos ensina como tal. É somente pela fé que acreditamos que, após as palavras do sacerdote, encontram-se o Corpo e o Sangue de Cristo realmente e substancialmente presentes sob as aparências de pão e de vinho. Após as palavras da consagração, ocorre, portanto, a transubstanciação: toda a substância do pão e toda a substância do vinho se convertem no Corpo e no Sangue de Cristo. Ora, como o Corpo e o Sangue de Cristo estão unidos à sua Alma e à sua Divindade, temos sob as espécies do pão e do vinho, o Corpo, a Alma, o Sangue e a Divindade de Cristo. A visão, o tato, o paladar todos os sentidos nos dizem que estamos diante de um pouco de pão e de um pouco de vinho. Todavia, sabemos pela fé e com certeza absoluta que estamos diante do Corpo, Sangue, Alma e Divindade do Senhor. Cremos porque Nosso Senhor nos falou claramente: “a minha carne é verdadeiramente alimento e o meu sangue é verdadeiramente bebida. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue fica em Mim e Eu nele.” (Jo 6, 56,57) Como o mistério da Santíssima Trindade de que tratamos domingo passado, só podemos reconhecer que Nosso Senhor está realmente presente na hóstia consagrada e no cálice consagrado pela fé. Fé que não contradiz a razão, mas a eleva.
A Eucaristia, instituída por Nosso Senhor, é ao mesmo tempo sacrifício e sacramento. A Eucaristia é um sacramento. A Eucaristia, como os outros seis sacramentos, foi instituída por Cristo para nos transmitir a graça de modo eficaz. Todavia, a Eucaristia não é simplesmente um sacramento, mas ela é o Santíssimo Sacramento. Ela é o Santíssimo Sacramento porque, além de transmitir a graça, como os outros sacramentos, ela contém o autor da graça, ela contém Nosso Senhor Jesus Cristo, homem e Deus. É o próprio Deus que se encontra na Eucaristia. É o próprio Deus que, no excesso de sua caridade, se entrega a nós como alimento na Eucaristia. Cristo se entrega a nós pela Eucaristia para que nos unamos intimamente a Ele, a fim de que sejamos transformados em outros Cristos, em almas que tenham as mesmas virtudes de Cristo. Esse pão vivo e celestial, esse pão dos anjos, conserva e aumenta a vida da alma, que é a graça. Ela obtém o perdão dos pecados veniais, se estamos arrependidos, e nos preserva dos mortais. Ela aumenta o fervor da caridade, nos dispondo a agir cada vez mais por amor a Deus.
A Eucaristia é também chamada de Santíssimo Sacramento do Altar. Do altar. O altar é o local onde se oferece o sacrifício. A Eucaristia é denominada Santíssimo Sacramento do Altar porque é pela Eucaristia, no momento da consagração, que se perpetua o Sacrifício de Cristo, oferecido no Calvário na Sexta-feira Santa. É a Missa o sacrifício da Nova Lei. As prefigurações e sombras do Antigo Testamento cedem lugar à realidade e à luz. O sacrifício de Melquisedeque, o sacrifício de Isaac, o sacrifício do cordeiro pascal, os sacrifícios do Templo anunciavam o sacrifício perfeito e imaculado de Cristo. Trata-se do único e mesmo sacrifício do Calvário que é renovado nos altares. É a mesma vítima: Cristo. É o mesmo sacerdote principal: Cristo, que na Missa age por meio do padre. Entre a Missa e o Calvário muda somente o modo em que o Corpo e o Sangue de Cristo são oferecidos à Santíssima Trindade. No Calvário, Cristo ofereceu sua humanidade derramando sangue, com sofrimento. No altar, ele se oferece, no momento da consagração, de modo incruento e sem sacramental, sem derramamento de sangue, sem sofrimento, sem morrer. Todas as graças que Cristo mereceu e adquiriu no Calvário são aplicadas pela Missa. É pela Missa que nos vêm todas graças. A Missa é um tesouro infinito. Nosso Senhor morreu na Cruz para nos salvar e instituiu a Missa como sacrifício perfeito da Nova Aliança, para renovar o sacrifício do seu Corpo e do seu Sangue, para aplicar seus méritos infinitos adquiridos no Calvário.
A Eucaristia, como falamos no início, é um Mistério da fé. Ela é também um Mistério da esperança. É Nosso Senhor que o diz: “o que come deste pão viverá eternamente”. Todavia, é preciso aproximar-se do Corpo de Cristo com as disposições corretas, pois quem come desse Pão ou bebe desse Cálice indignamente será réu do Corpo e do Sangue de Cristo, bebendo a própria condenação, como nos diz São Paulo. Devemos nos aproximar da comunhão com as disposições corretas, disposições de que tratamos não faz muito tempo (ver sermão sobre o milagre da multiplicação dos pães): necessidade de ser católico, batizado, estar em estado de graça, estar em jejum de pelo menos uma hora, aproximar-se da comunhão com devoção e vestido modestamente. Recebendo bem a Eucaristia, podemos esperar vencer nosso combate nesse vale de lágrimas e alcançar o céu. A Eucaristia nos dá forças para alcançar o céu como o maná deu força aos judeus para a travessia do deserto e como o pão que Deus deu a Santo Elias permitiu que o santo profeta andasse ainda mais 40 dias e 40 noites (I Reis, 5). A Eucaristia é um mistério de esperança.
A Eucaristia é também um mistério de caridade. Mistério da caridade porque nos é impossível compreender o amor infinito de Deus para com os homens. Não bastou à caridade de Nosso Senhor morrer na Cruz para nos salvar, pobres pecadores. Ele quis permanecer conosco e permanecer conosco real e substancialmente com seu Corpo, Sangue, Alma e Divindade. De fato, Nosso Senhor nos amou e nos amou até o fim, quer dizer, ao máximo, buscando a nossa salvação. A Eucaristia é mistério da caridade porque, como nenhum outro sacramento, ela nos transmite a graça e aumenta o fervor da caridade. Nós cremos na presença real de Nosso Senhor Jesus Cristo não somente porque Ele nos falou. Nós acreditamos na presença real porque nós cremos no amor de Deus (I Jo, 16) por nós. De fato, é preciso crer no amor infinito de Deus pelos homens para poder crer na Eucaristia. O que Deus não faz por nós, caros católicos? Não sejamos ingratos. Acreditemos no amor de Deus e deixemos que essa caridade guie as nossas vidas, para que façamos em todas as coisas a perfeita vontade divina.
Sendo o sacramento da Eucaristia um mistério de fé, de esperança e de caridade, ele é também o sacramento da nossa consolação. Diante da tristeza, quando nossa alma pergunta “por que, Deus, anda a minha alma triste, diante das aflições causadas pelo inimigo?” não deixemos nos abater. Podemos ficar triste diante de certos males, mas nunca abatidos, desesperados. Se a tristeza começa a crescer e a se apoderar de nosso coração, ela perturbará a nossa alma, perturbando o uso da razão, prejudicando a virtude. Diante da tristeza, olhemos para o Sacrário. Pensemos no amor divino. Busquemos consolo em Deus. Encontraremos consolos diante das misérias da vida na medida em que estivermos unidos a Deus. Nas criaturas, nos amigos, nas diversões lícitas, podemos até encontrar algum consolo, mas é passageiro. Deus deve ser nosso supremo e, na verdade, único consolo, pois é Ele o bem infinito. Por que está triste a minha alma, quando Deus fez tudo para me salvar? Enquanto sacrifício, a Eucaristia nos coloca diante dos olhos os sofrimentos de Cristo, para que possamos unir os nossos aos dEle, e somos consolados.  Enquanto sacramento, Nosso Senhor está conosco na Eucaristia como amigo, que quer o nosso bem disposto a nos ajudar a carregar o nosso jugo, para aliviá-lo, e, assim, somos consolados. Não deixemos a tristeza tomar conta de nossa alma. Dirijamos o nosso olhar e a nossa alma ao sacrário, onde Nosso Senhor quis ficar, humildemente e muitas vezes desprezado, para nos salvar e consolar.
A Festa de Corpus Christi é a festa do triunfo da fé e a festa do triunfo da caridade divina. Quão desprezado encontra-se Nosso Senhor na Eucaristia. Quanta irreverência na celebração das Missas, quantos sacrilégios cometidos naquilo que há de mais sagrado na face da terra. Quanta irreverência na recepção da Santa Eucaristia, quantos comungam sem pensar se estão em estado de graça ou não. Quantas partículas em que Nosso Senhor está realmente presente se perdem em comunhões feitas na mão. Quanta irreverência nos gestos e nos trajes diante do Altíssimo.   Devemos, então, com entusiasmo redobrado professar com muita solenidade a nossa fé na presença real e substancial de Nosso Senhor Jesus Cristo na Eucaristia. Devemos confessar com muita solenidade a caridade divina para conosco e agradecer por todos os seus inumeráveis benefícios. Não bastam, porém, os ritos e solenidades exteriores, caros católicos. Devemos afirmar nossa fé e expressar o nosso amor e gratidão para com Deus interiormente, antes de tudo, convertendo-nos inteiramente a Ele, tomando a firme decisão de servi-lo. Façamos isso comungando com grande devoção e assistindo piedosamente à Santa Missa. Ofereçamos essa Missa e a nossa comunhão nesse dia, em reparação pelos nossos próprios pecados, pelos pecados públicos, pelos pecados de nossa nação e de todos os povos. Olhando para a Eucaristia, devemos crer no amor de Deus para conosco e devemos responder a tão insistentes chamados de Nosso Senhor para que nos convertamos. Que Cristo Eucarístico possa reinar em nossas almas e nas nações.
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.
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