12 de junho de 2014

Pensamentos Consoladores de São Francisco de Sales.

3/14  -  Das orações convenientes aos enfermos.

O leito de um enfermo é para ele um altar de sacrifício. Feliz o justo que não perturba o sacrifício pelos seus gritos e murmúrios e adora esta mão benfazeja, oculta nos instrumentos que emprega e ama estes golpes salutares e sente todo o mérito dessa distinção. Como sairá brilhante a sua alma do cadinho das tribulações! É um ouro experimentado sete vezes; esta marcado com o sinete dos eleitos e tem a própria insígnia de Jesus Cristo. Não é bom mandar dizer a missa dos quartos; adorai do vosso leito a Jesus Cristo no altar e contentai-vos com isso. Daniel, não podendo ir ao templo, virava-se para esse lado para adorar a Deus; fazei o mesmo. Mas aconselho-vos que comungueis todos os domingos e festas, no leito, se os médicos vô-lo permitirem. Nosso Senhor visitar-vos-à voluntariamente no leito da aflição.
Se não rezais muitas orações durante a vossa doença, ou de vosso marido, fazei com que a doença seja uma contínua oração, oferecendo-a ao que amou tanto as nossas enfermidades, que no dia das núpcias e da alegria do seu coração, como diz o Amante sagrado, coroar-se-á.
Aspirai a Deus por curtos, mas ardentes suspiros do coração; admirai a sua beleza; invocai o seu auxílio; adorai a sua bondade; entregai-lhe a vossa alma mil vezes por dia; fixai a vossa vista interior no seu palácio; estendei-lhe a mão como uma criancinha a seu pai para que ele vos guie.
Este exercício não enfada, porque se pode unir com as nossas ocupações, sem as perturbar e retardar. O peregrino que bebe um  pouco de vinho, para alegrar o coração, embora se demore um pouco para isso, não retarda a viagem: mas toma novas forças para a concluir mais depressa, parando para andar mais.
Quando deu Nosso Senhor mais glória a Deus, senão quando tinha as mãos e os pés cravados à cruz?
Eis o grande ato do seu serviço. E como o servia? Sofrendo e oferecendo; os seus sofrimentos eram uma oferta cheia de suavidade para com seu Pai. Enquanto estiverdes doentes, usai duma meditação regulada; porque suportar os açoites de Nosso Senhor não é menos meritório do que meditar; porque é melhor estar com Jesus Cristo na cruz do que meditá-lo  na oração.
Poupai-vos quando puderdes, enquanto durar a presente doença; não vos obrigueis senão com doçura a praticar qualquer exercício. Se vos cansais em estar de joelhos, sentai-vos. Se não podeis orar meia hora, orai um quarto de hora, ou ainda menos. Ponde-vos na presença de Deus e sofrei aí as vossas dores.
Quanto a meditação, tem razão os médicos; enquanto estiverdes doentes, não a façais, e para reparardes esta omissão, fazei o duplo de jaculatórias e aplicai tudo a Deus por uma condescendência ao seu agrado, pedindo-lhe que nunca se separe de vós dando-vos este embaraço para a oração; porque se faz isto, é sem dúvida para vos unir a Ele mais solidamente, pelo exercício da resignação santa e tranquila.
Que nos importa que pertençamos a Deus, de uma forma ou de outra? Em verdade, visto que só a Ele procuramos e que tanto o encontramos na mortificação como na oração, sobretudo quando nos envia a doença; porque tanto devemos estimar uma como a outra além de que as jaculatórias e elevações de espírito são orações contínuas; e o sofrimento é a mais digna oferenda que podemos dar a quem nos salvou sofrendo. Pedi que de quando em quando vos leiam algum livro bom, como o Tratado da conformidade com a vontade de Deus, de Rodrigues; o Consolador dos enfermos, por Lambillotte; os Sofrimentos de Jesus Cristo. Não vos inquieteis por não puderdes servir a Deus a vosso gosto; porque sujeitando-vos aos incômodos, servi-lo-ei ao seu gosto, que vale mais do que o vosso. Seja Ele sempre bendito e glorificado.
Quando vos conceder a saúde continuareis a oração; pelo menos meia hora pela manhã, e um quarto de hora à tarde, antes de cear; porque depois que Nosso Senhor vos dê a prova o mel celeste será uma afronta não gostardes dele. Convém pois animar-vos, e não consentir que as conversações vos privem dum bem tão grande e raro, como o de falardes com Deus com o coração unido ao dele.
Não pareis quando vos quiserdes lamentar; mas queixai-vos a Deus, com o espírito filial como uma criança à sua mãe; porque sendo com amor, não há perigo em nos queixarmos, nem em pedirmos a saúde, nem em mudarmos de lugar, nem em pedirmos alívio; convém só que façais isto com resignação e amor nos braços da santíssima vontade de Deus.
Não vos apoquenteis em não praticardes bem os atos de virtude: porque, como vos disse, não deixam de ser bons por serem feitos com languidez e como que a força. Não podereis dar à Deus o que tendes e em ocasião de aflição nada mais tendes.
Suponho que a melancolia servir-se-á da vossa indisposição para vos entristecer ainda mais e que vendo-vos triste vos inquietareis; mas não o façais, eu vô-lo peço. Se estais pesado, triste e melancólico, não deixeis por isso de estar em paz, e embora penseis que tudo o que fazeis é sem gosto, sem sentimento e sem força, não deixeis por isso de abraçar a Nosso Senhor Crucificado e de lhe entregar o vosso coração e de lhe consagrardes o espírito com os afetos lânguidos como estão. A beata Ângela de Foligno dizia que Nosso Senhor lhe tinha revelado que nenhum bem lhe agradou tanto como o que era feito por força; isto é, o que lhe faz uma vontade resoluta contra a languidez da carne, as repugnâncias do corpo e entre as securas, tristezas e desolações interiores.
Oh! Meu Deus! como sereis felizes se fordes fiéis nas vossas resoluções, entre as cruzes que se vos apresentaram, Aquele que vos amou até a morte e morte de cruz.
É uma verdade manifesta que as nossas almas contraem na parte íntima as qualidades e condições dos corpos; e digo na parte íntima, porque é a que esta mais ligada ao corpo e que mais participa dos seus incômodos. Um corpo delicado, enfraquecido pela doença,  incomodado com muitas dores, não permite ao coração ser tão vivo, ativo e pronto em suas operações; mas nada disto prejudica os atos do espírito, que são tão agradáveis à Deus, assim como entre as alegrias do mundo, por serem feitos com mais pena e trabalho; mas não são tão agradáveis à pessoa que os faz, porque não estando na parte sensível, não são sensíveis, nem delicados.
É preciso não sermos injustos, e não exigirmos de nós senão o que temos. Quando estamos incomodados basta que peçamos ao nosso espírito atos de submissão e aceitação do trabalho e das santas uniões da nossa vontade ao agrado de Deus; e quanto as ações exteriores, convém ordená-las e praticá-las o melhor que pudermos, contentando-nos com as praticar, embora com languidez e contra vontade. E para terminarmos esta languidez e estes pesadelos do coração, e fazer que eles sirvam ao amor divino, convém que aceitemos e amemos a própria abjeção; desta forma transformareis o chumbo do vosso torpor em outro mais fino do que o das maiores alegrias do coração. Tende paciência convosco mesmo; e suporte a vossa parte superior o enfraquecimento da inferior.
Agora o vosso Amado é para vós um ramalhete de mirra; apertai-o ao vosso coração. O meu Amado é para mim e eu para Ele; estará sempre em meu coração. Isaias chama-o o Homem de dores. Ele ama as dores e os que as sofrem. Não vos atormenteis em praticar muito; mas disponde-vos a sofrer com amor o que sofrerdes, e Deus vos será propício. Ou lânguidos, ou vivos, ou moribundos, pertencemos a Deus e nada nos separará do seu amor tendo a sua graça. Nunca o nosso coração terá vida senão nele e por Ele; e será sempre o Deus do nosso coração.

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