1 de agosto de 2016

Sermão para o XI Domingo depois de Pentecostes - Diác. Marcos Mattke, IBP

XI Domingo depois de Pentecostes.

Diác. Marcos Vinicius Mattke, IBP

31.07.2016

Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Amém.

Revmos. Padres,
Prezados seminaristas,
Caríssimos fiéis,

“Meteu-lhe Jesus os dedos nos ouvidos, e tocou-lhe a língua com a sua saliva; depois, levantando os olhos ao céu, suspirou, e disse-lhe: Effeta, que quer dizer: Abre-te. Imediatamente se lhe abriram os ouvidos, e se lhe soltou a prisão da língua, falando normalmente”
 (Mc. VII, 33-35)

A liturgia de hoje nos recorda o dia de nosso batismo, quando o sacerdote, seguindo o exemplo de Cristo, tocou nossos ouvidos e língua dizendo essas mesmas palavras: “effeta, abre-te”, para que nós também, pela graça do batismo, possamos escutar e falar a Deus, bem como, falar de Deus, cooperando com a sua graça, que, como apresenta a Epístola, não deve ser vã em nós (I Cor. XV, 10).

Vejamos, primeiramente, o que Jesus fez.

Estava Nosso Senhor indo de Tiro, ao Mar da Galiléia quando trouxeram-lhe um surdo-mudo e rogaram-lhe que lhe impusesse a mão e Jesus assim o faz. Porque essa atitude de Jesus? Aliás, ele não somente lhe impõe a mão, mas toca seus ouvidos e impõe saliva na língua do doente, numa atitude que pode parecer estranha a muitos atualmente.

Com efeito, Jesus, sendo verdadeiramente Deus, poderia perfeitamente curá-lo com um simples ato de sua vontade, como fez ele com o servo do centurião, que, em um ato de fé na divindade de Cristo, afirmou “Senhor, eu não sou digno de que entreis em minha casa. Dizei uma só palavra e meu servo será curado” (Mt. VIII, 8).

Mas, segundo São Tomás de Aquino, busca o Salvador mostrar por estes atos corporais que é pela sua encarnação que ele traz a salvação, pois é assumindo a carne humana que ele estabeleceu a ponte entre Deus e os homens e pôde obrar nossa redenção, donde afirma Tertuliano (De carnis resurrectione, VIII, 3: PL 2, 806): “caro salutis est cardo”, “a carne é o eixo da salvação”.

Diz o Grande Doutor em sua Suma de Teologia (IIIa, q. XLIV, a. 3, ad 2um): “Cristo veio salvar o mundo não somente pelo poder divino, mas também pelo mistério da própria encarnação. Por isso muitas vezes ao curar os doentes não somente se servia do poder divino, curando com uma ordem, mas também aplicando algo pertencente à própria humanidade”.
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Além disso, todos os atos de Nosso Senhor transmitem ensinamentos necessários para a nossa salvação. Neste Evangelho Cristo cura a surdez e a mudez física, que representa, segundo Santo Agostinho, uma surdez e uma mudez muito pior, a surdez e a mudez espiritual.

A surdez espiritual: o surdo espiritual é todo-ouvidos ao barulho ensurdecedor dos inimigos de nossa alma: o demônio, o mundo e a carne. Escravo do pecado, ele é incapaz de ouvir a palavra de Deus que fala ao homem das mais diversas maneiras: seja pela própria criação, que proclama a glória de Deus, como diz o salmista (Sl. XVIII, 2),  possibilitando um conhecimento natural de Deus, Criador do universo, que tem em si de forma infinita todas as perfeições das criaturas; pela revelação sobrenatural de Deus, que revelou-se a si mesmo aos homens, primeiramente, pelos profetas e mais tarde por meio da encarnação do seu Verbo, Nosso Senhor Jesus Cristo; seja pela sua Santa Igreja, instituída para ser guardiã do depósito da fé, para defender a sã doutrina e pregá-la, sem  corrupção, para todo o mundo, por meio de seu magistério; enfim através da consciência, que em primeira instância acusa o homem dos pecados cometidos.

Não imaginem, caríssimos, que os surdos espirituais são somente aqueles que nunca ouviram a pregação evangélica ou que nasceram no erro. Também os cristãos podem se tornar surdos espirituais: pelo pecado, pela vida cristã medíocre, pela vida mundana, pelos vícios não combatidos, pois que assim o homem se faz surdo a Deus, que, pela sua graça busca incessantemente conduzi-lo à vida eterna, e dá ouvidos ao demônio, que quer impedir o homem de atingir o seu fim último que é Deus, conduzindo-o para a escravidão do pecado.

Tenha-se, ainda, cuidado com uma surdez muito mais sutil, que advém pelas distrações do mundo e que tira a atenção dos ensinamentos que foram até escutados e assimilados, mas que não foram postos em prática ou foram rapidamente esquecidos, fazendo o homem se desviar de seu fim último. E, de fato, é grande a agressividade que têm os inimigos de nossa alma na sociedade atual! Com efeito, se o católico não se mantém firme e vigilante na sua vida espiritual, será ele fácil e rapidamente esmagado pelos inimigos de sua alma, que entram em sua vida por tão variados meios, como a TV, a Internet, os jogos, o celular, o rádio, as más companhias, etc. etc. etc.

E com essa surdez espiritual, vem junto a mudez espiritual: ignorando a palavra de Deus, os mudos espirituais não dão ao Senhor o louvor e a glória que lhe são devidos. Escravos do pecado, eles não conseguem dirigir suas ações para Deus. Eles não têm Deus em seus lábios e não elevam seu pensamento àquele que é o Senhor do universo e da história. Não ordenados ao seu fim último, ofendem a Deus por seus pecados; buscam glorificar-se a si mesmo em suas ações, e não Deus; gloriam-se de suas perfeições, como se não as tivessem recebido de Deus; enfim, não buscam a amizade de Deus, não se unem a ele nesta vida – e separados dele nesta vida, caminham para separação eterna de Deus. Enfim, tais mudos, não somente não falam a Deus e não falam de Deus como também, pelo seu mau exemplo pregam e espalham a vida sem Deus, colaborando para o domínio do pecado sobre os homens.

Mas qual é o remédio para esta deplorável e terrível doença, que se não curada leva à morte eterna? Nada mais é que a mão estendida por Cristo. Somente Deus pode curar alguém que chega em tal estado de surdez e mudez espiritual. E o que faz Nosso Salvador com o surdo-mudo que lhe foi apresentado? Ele o põe antes de tudo à parte da multidão, isto é, longe das atrações do mundo, dos prazeres carnais, das pompas do demônio. No meio do caos e das atrações do mundo não é possível ao homem notar a sua situação espiritual e ouvir a Deus. Donde a importância do recolhimento e da meditação no dia a dia para que possamos ter sempre diante de nossos olhos o fim de nossa vida e possamos escutar e louvar a Deus, e a Ele nos dirigir e nos unir. Ainda, note-se que, incapaz de ter consciência e pedir o remédio necessário para sua cura, o surdo-mudo do Evangelho foi levado por outros a Cristo – trouxeram-lhe – um bom símbolo da necessidade do apostolado para a salvação das almas. Em seguida, Nosso Redentor olha para o Céu, mostrando donde se deve esperar a salvação e geme, compadecendo-se da miséria do homem separado de Deus. Então toca os ouvidos, para abri-los para a palavra de Deus e o toca a língua com sua saliva, símbolo da sabedoria divina, para que seus atos sejam por ela guiados.

Caríssimos, com a graça de Deus, que recebemos no nosso batismo, nossos ouvidos foram abertos para a palavra de Deus e nossas línguas libertas para seu louvor, e, recebemos o Evangelho da Salvação. Roguemos, pois, a Deus a graça de sermos fiéis à sua palavra e não a silenciarmos, mas que a proclamemos do alto dos telhados (Mt. X, 27), como ordenou Nosso Senhor, para que possamos dizer com São Paulo, na epístola de hoje , “ensinei-vos o mesmo que me foi transmitido” e “sua graça não foi estéril em mim”.

Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Amém. 

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